segunda-feira, maio 16, 2005

9,5 + y/z + (-20) = 0? (II)

A proposta (?) do ministro Mariano Gago de encerrar os cursos que tenham menos de 20 alunos tem levantado algumas ondas de preocupação por parte de Universidades e Politécnicos. Neste post darei continuidade ao post anterior [9,5 + y/z + (-20) = 0? (I)] onde me referi à classificação mínima de 9,5 nas provas específicas para ingresso no E.S. Por pontos:

1. Em primeiro lugar a proposta (?) carece de esclarecimento. Refere-se ela a 20 alunos no primeiro ano do curso? No conjunto de todos os anos curriculares? Não se sabe. Não é despicienda a segunda hipótese. Um cenário destes não é de descartar dada a sanha de cortar despesas em todo o lado. Adivinha-se que, neste último caso, um curso simplesmente não encerraria deixando os seus alunos “ao Deus dará” mas poderia não admitir alunos no ano lectivo seguinte extinguindo-se à medida que os alunos se iam formando. Em qualquer dos casos, urge esclarecer a natureza da proposta. Qualquer que seja a resposta ela não explica o carácter arbitrário do número 20. Qual o estudo que sugere o 20 como mínimo ideal? E mínimo ideal para quê? Porquê? Porque não 15? 25? 30? Está abrangido o ensino não público? Presumivelmente não…

2. O bom senso dita que quando uma regra tem mais excepções do que os casos que encontram a sua concretização, a regra não presta. A história recente ensinou-nos que o critério da “relevância social”, tão caro a um ex-ministro do ensino superior e investigação não fez qualquer escola. Exemplo disso é o caso do I.S.C.T.E. onde o corte de vagas, há poucos anos, atingiu cegamente todos os seus cursos. Facilmente se poderá pensar que escolas superiores que possuem um curso que lhes é exclusivo ou quase devem ser excepções à regra (casos de Oceanografia, Eng.ª Aeronáutica, Naval e Têxtil entre outros); facilmente se poderá pensar – porque a proposta não contemplará, julgo eu, o mero encerramento total de escolas – que instituições como o caso de alguns pólos de Politécnicos ou Universidades (Angra do Heroísmo ou Lamego, entre outras) não serão simplesmente extintos de um momento para o outro; facilmente se poderá pensar que não ocorrerá o encerramento de grande parte de Universidades onde a maior parte dos seus cursos têm menos de 20 alunos (casos das Universidades da Madeira, do Algarve, de Évora e da UTAD); facilmente se poderá pensar que não se vão encerrar todos os cursos que, embora existindo em várias escolas (Educação Musical, Dança e outros) mas tendo menos de 20 alunos cada um, o seu encerramento causaria a simples extinção dos mesmos; facilmente se poderá pensar que não iriam encerrar a maior parte das escolas superiores politécnicas do interior do país e algumas do litoral de um momento para o outro… só estas medidas excepcionais já propiciavam o não encerramento de muitos dos cursos que têm menos de 20 alunos…

3. Se um presidente de um Instituto Politécnico, de uma Universidade ou de uma das suas escolas, à guisa do princípio do argumento da proximidade entre a natureza dos cursos da instituição e as necessidades/mais-valias económicas, sociais e culturais da região onde a escola está inserida, “provar”, na senda da sua “autonomia”, com um estudo “cientificamente” válido, … e feito por uma entidade “independente”, … e com dados "incontestáveis" de que os alunos formados por cursos com menos de 20 alunos encontraram total ou parcialmente saídas profissionais na região onde a escola está inserida, quem é o MCTES para contestar? Mais excepções à regra? E legítimas?

4. Um número razoável de cursos tem um numerus clausus inferior a 20 por razões perfeitamente legítimas do ponto de vista pedagógico, curricular e logístico. São cursos que se prestam a não admitir muitos alunos porque envolvem condições “especiais” do ponto de vista dos materiais, das instalações, do ratio professor-aluno tido como ideal, do ponto de vista da sua organização e desenvolvimento curricular, das especificidades dos locais a estagiar, da natureza do profissional a formar e, finalmente, da expectativa da necessidade dos formados pelo mercado de trabalho. Estão neste caso alguns cursos de formação inicial de banda estreitíssima (o que pode ou não ser questionável…) como os de música, com a especialidade num determinado instrumento musical. Mas também os de Dança, Teatro, Cinema, para falar no caso das artes mas também algumas engenharias, alguns cursos de multimédia (pelos recursos tecnológicos envolvidos) e até de humanidades, como o caso de Arqueologia, línguas estrangeiras que não envolvam o inglês, alemão ou o francês, ou ainda outros na área de formação de professores direccionados para crianças com necessidades educativas específicas. E ainda outros que não me ocorrem presentemente…

5. E finalmente, mas não menos importante, a exigência de se ter mais que 20 alunos num determinado curso (por exemplo, na admissão), enleia um convite à massificação. Se, por um lado, cursos que preenchem totalmente as suas vagas nas ordens dos 50, 75, 100 ou mais alunos (numa mesma escola ou numa mesma região) já formam estudantes que vão encontrar altas probabilidades de desemprego no mercado de trabalho (caso de Direito ou certas engenharias), não são abrangidos por esta proposta o que está em jogo afinal? Seguramente não é a empregabilidade. Ora muitos destes cursos já estão organizados de um modo onde se concentram várias dezenas de estudantes em amplos anfiteatros numa lógica taylorista de educação: as aulas teóricas massificadas constituem verdadeiras “fábricas” de ouvintes (interessados?) onde qualquer relação professor-aluno é atomizada e onde tanto uns como outros são perfeitamente despersonalizados. Querer-se-á o mesmo para cursos que ainda não são caracterizados por este ambiente curricular massificado? E como fica os ratios professor-aluno perfeitamente institucionalizados e aceites pelo poder oficial? Como se pode pedir ao Instituto Superior Técnico que tem em alguns cursos um ratio de professor-aluno de 8 para 1 que encerre um curso porque teve menos de 20 alunos no ingresso?

Defendo há muito tempo uma racionalização e fusão curricular de alguns cursos. Na realidade da formação inicial de professores, que conheço melhor, dada a estrutura curricular de muitos dos seus cursos, a existência de um tronco comum aos dois primeiros anos e a diferenciação, conforme o professor a formar, nos anos seguintes, presta-se à maior parte dos cursos. O mesmo pode acontecer em certas engenharias, línguas e literaturas. Na verdade, tal já ocorre em muitas escolas do ponto de vista do currículo real mas não do oficial. O que revela alguma falsidade nos números oficiais emanados pelas universidades e politécnicos. Depois, com o correr do tempo, considerando os níveis de empregabilidade (para que servem os observatórios de emprego?) ou outros critérios objectivos (os índices de procura, ou a interioridade da instituição, por exemplo) e iguais para todas as instituições que tivessem o mesmo tipo de cursos, o numerus clausus poderia subir ou descer. Esta fusão encontraria, com um certo planeamento (e concretização) curricular, um eco ajustado aos mecanismos de 3+2 ou 4+1 proposto por “Bolonha”, ajustava-se à idealização de perfis de saída particulares e esclareceria que profissionais poderiam ocupar quais lugares ocupacionais no mercado de trabalho…

sábado, maio 14, 2005

“A destreza das dúvidas acaba aqui.”

O nosso colega Luís Aguiar-Conraria está a passar por um problema que o atormenta bastante. Depreendo que seja a saúde um familiar que lhe é bastante próximo. Com aquela frase lapidar, decide terminar o seu blog, A Destreza das Dúvidas, que tanto nos animou, enfureceu, informou, esmoreceu, apaixonou…
Desejando que o problema que atormenta o Luís seja rapidamente resolvido ou minimizado, anseio que ele reconsidere e regresse ao nosso convívio...

No princípio era o verbo…

O Acontecencias acha que existe uma relação – profética mesmo - entre o clube que vai ganhar a Super-Liga (“super”?) e a correcção linguística do Presidente de um dos clubes aspirantes a essa vitória.
Inquirido sobre se este clube iria encimar a classificação final da Super-Liga num jantar com adeptos, aquele presidente (que não identificarei para não ferir susceptibilidades...) terá dito:

-“«Há-dem» ver! «Há-dem» ver...

"O nosso ridículo cresce na proporção em que precisamos dele"
Pierre Laclos

quarta-feira, maio 11, 2005

9,5 + y/z + (-20) = 0? (I)

As recentes propostas (?) do ministro Mariano Gago para o acesso ao ensino superior causam-me mixed feelings. Retenho apenas a proposta da nota mínima de 9,5 valores (numa escala de 0 a 20) ou 95 pontos (noutra de 0 a 200) e a necessidade de um curso ter um mínimo de 20 alunos para poder funcionar. Neste post falarei apenas da primeira deixando a segunda para post ulterior…

A questão da nota mínima é complexa. A função docimológica das classificações das provas específicas para ingressar nas instituições de E.S. não é tanto avaliar a posse de conhecimentos mas meramente seriar as notas de quem prestou aquelas provas. Não há qualquer intenção formativa: não há uma lógica curricular subsequente que deriva da maior ou menor posse (e qualidade) de conhecimentos demonstrada nas ditas provas pelos candidatos nem as instituições enformam eventuais conteúdos, métodos ou estratégias em determinadas disciplinas em função dos resultados obtidos pelos candidatos que acabam por ingressar na escola. Por muito bons ou maus que tenham sido os resultados, as classificações obtidas não corporizam, por outro lado, qualquer tipo de avaliação diagnostica. Não há qualquer tipo de despiste. Os candidatos com piores classificações (e, por tal, à priori, mais dificuldades) que ingressarem terão os mesmos conteúdos e as mesmas disciplinas e, presumivelmente, leccionadas de igual maneira do que aqueles que obtiverem nas mesmas provas altos índices de sucesso. As provas servem, então, uma mera lógica de avaliação sumativa “gaussiana”.

É crível que haja um referencial mínimo para um aluno ingressar no ensino superior. Pode ser discutível que seja o 9,5 ou o 9,0 ou o 10,0 mas um mínimo tem que haver. De resto, de um ponto de vista meramente estatístico, o 9,5 é tão aleatório como o 9,0 ou 0 8,5. A decisão humana é que impõe o significado de que a partir do 9,5 é que se situa a “positiva”. Mais ainda, é também uma decisão relativamente subjectiva que o 9,5 “já seja” positiva dado o arredondamento. Entendamo-nos nisto.

Crível não é, como já ouvi dizer, que um aluno que tem a classificação de 18 no conjunto das notas do secundário não ingresse numa determinada escola porque tirou um 9,4 na prova específica e outro com 10 e 9,5 respectivamente já ingresse. Constitui um argumento falacioso e “chantagista” de quem o profere. Tal situação poderia acontecer qualquer que fosse o mínimo estipulado para as provas específicas: sempre se poderá ficar a um "milímetro" do mínimo qualquer que ele seja, ou sempre se pode metaforicamente dizer que “foi por um triz” ou que “se morreu na praia”. Entendamo-nos nisto também.

Posto isto, e considerando que a necessidade de existirem mínimos para ingressar na E.S. é incontornável e que a tal não estará alheia a intenção mais ou menos sincera, mais ou menos mercantil, mais ou menos hipócrita, de existir um padrão mínimo de qualidade nos alunos das instituições de E.S. e nestas por arrastamento, não me choca que a média de acesso resulte de uma ponderação das classificações do conjunto do Ensino Secundário mais a nota das provas específicas. Mas mesmo aqui teria que haver também mínimos. E o 9,5 poderia sê-lo. Para tal, urgia que todas as instituições tivessem as mesmas provas de acesso (coisa que não acontece) para os mesmos cursos e os mesmos factores de ponderação para os diferentes produtos a ponderar (50%/50%?).

Vejamos outra situação: no meu tempo de estudante de licenciatura (e anteriormente também no Ensino Secundário – não sei se ainda é assim…) poder-se-ia ter acesso a um exame oral e daí “passar” à disciplina se se obtivesse a nota de 8 (oito) valores. Havia ainda professores que consideravam esse 8 arredondado do 7,5 e outros que não. Além da subjectividade puramente humana, para não dizer pessoal, que assumpção se retira daqui? É um aluno medíocre mas talvez nos apercebamos melhor das suas capacidades se ele prestar uma prova oralizada”? Não, claro que não. Estipular o mínimo de 8 valores foi (é?) uma decisão tão arbitrária como considerar que a partir do 9,5 se atinge um mínimo. Diferentes professores podem atribuir, para a mesmíssima prova diferentes classificações. E serão decisivas se um atribuir 9,5 e outro 9,2 para a mesma prova. Uma universidade não pública portuense tinha aqui há anos uma escala de 0 a 14 valores sendo que para "passar" se exigia um mínimo de 10. Não sei se ainda é assim. Alta exigência? Não sei...

Estudos confirmam que por mais que se queira a avaliação (e classificação) nunca é 100% objectiva (e valerá a pena discutir o conceito de objectividade?): um investigador pediu a um docente que corrigisse e classificasse um conjunto de provas da sua área de docência. Cerca de três meses depois pediu ao mesmo docente que fizesse o mesmo para outras provas. Na verdade eram as mesmíssimas mas redigidas com outras grafias, outros tipos de folhas, etc. Apenas se mantinham as mesmas perguntas e as mesmas respostas. Os resultados evidenciaram que as classificações diferenciaram-se até 6 valores. Não me peçam para dizer se foram controladas todas as variáveis parasitas que não retenho de memória. Acreditando no estudo, ele evidenciava que a subjectividade (e arbitrariedade?) da avaliação está sujeita até aos ritmos fisiológicos e disposições psicológicas do “corrector/avaliador”.

Um dia um aluno escreveu-me quatro páginas completas para um exame que tinha 5 perguntas. Li-o. Sempre com alguma flexibilidade, tinha (como sempre tenho) critérios de correcção pré-definidos e ponderados. Dei-lhe um 0 (zero) numa escala de 0 a 20. Nunca tal me tinha acontecido. “Zeros” dava quando um discente entregava a folha de respostas em branco. Reli a prova. Não podia ser. O imenso chorrilho de disparates, um conjunto de argumentos que rigorosamente nada tinham a ver com a natureza das perguntas fez-me confirmar o "zero". Mais tarde na época de recurso, apesar de o mesmo aluno ter escrito na prova que era condenável que o seu professor (eu) tivesse andado na escola com uma camisola de um clube lisboeta da zona de Alvalade (não digo qual…), passou com 14 (catorze). Até o "insulto" se adequava à uma questão relacionada com a natureza do “currículo oculto”. Subjectividades?

Qualquer que seja a nota mínima de acesso, é sempre uma decisão relativamente arbitrária se é um 8,0, 9,5 ou um 10. Mínimo terá sempre que haver. E é dificil que este não seja quantificado. Mas o importante é assegurar um debate que esclareça a posse de competências mínimas que configurem um “perfil de entrada” apropriado à natureza do curso a ingressar, que assegurem um mínimo de qualidade dos recém ingressados e, subsequentemente, as respectivas instituições e que tentem assegurar um nível razoável de exigência e rigor (até para o boa prossecução do ideal de “Bolonha”). E não é exclusivamente com discussões vãs de números que se chega lá. A bem dos alunos, dos professores e das instituições.

segunda-feira, maio 09, 2005

Flagrantes da Vida Real (V)

Vim à rua para cortar o cabelo. Nunca o tinha feito naquela cidade. Mas já tinha escolhido um cabeleireiro que me parecia asseado. Já estava algo impaciente na procura por um lugar para estacionar quando topei um lugarzito jeitoso. Pisca e lentamente, de marcha atrás, iniciei a manobra. Estacionei.

Só já fora do carro é que me apercebi que estava estacionado em lugar proibido. Metros atrás o devido sinal avisava. Cioso destas coisas decidi ir tirar o carro. Não me importei que várias viaturas estivessem a transgredir. Inicio manobra de saída. Pisca. Eis que surge um jovem motoqueiro e querer estacionar no pouco espaço para o manobrar que tinha à frente do automóvel. “Ó chefe? Espere lá um bocadinho que eu saia!”. Disse. Não reagiu. Julguei que não tinha ouvido. Não havia grande maneira de tirar o carro se ele estacionasse à frente da minha viatura. “Chefe? Depois de eu sair até fica com mais espaço… veja lá…”. Que não… “Pensa que a estrada é toda sua?! Estes gajos! F+d+-se!”. Gritou. “Ó homem! Tenha calma!”. Retorqui. E desbaratou com insultos. Chega um polícia. Fala com o jovem motoqueiro. Nada oiço. Ele tira a mota. O simpático polícia dá-me indicações para sair com os gestos apropriados, não me multa (!) e manda parar uma viatura para facilitar a minha saída. Eu agradeço com um gesto. O jovem motoqueiro abala fazendo-me outro gesto: imita o falo com a mão direita e direcciona-o para mim.

Acabo por estacionar num parque próximo e vou para o cabeleireiro. Só uma cadeira está vazia. Um cabeleireiro a atender outro cliente diz-me: “Sente-se aí que o meu colega vem já...”. Sento-me e espero. Chega o “colega”. Estarreço e ele também. É o jovem motoqueiro

quarta-feira, maio 04, 2005

É verdade, não é?

Excerto de um diálogo do filme “Contacto” baseado em obra homónima de Carl Sagan.

(…)

David Drumlin: “Ellie… o mundo pode ser muito injusto…
Ellie Arroway: “Engraçado… sempre pensei que o mundo era o que fazíamos dele…

terça-feira, maio 03, 2005

O porquê dos meus blog’s favoritos (I)

Cá vão eles. A ordem é puramente alfabética.

A Destreza das Dúvidas
Porque, embora muito orgulhoso, é assertivo. Porque dá-me a conhecer uma realidade que ainda anseio experimentar e porque deliciam-me as crónicas sobre “o Patrick foi a este sitio, o Karl disse aquilo,…” e lá vou eu, interessado nesta novela académico-mexicana, recuar vários post’s para enquadrar as personagens do “Patrick” e do “Karl” para poder perceber a trama. E as crónicas vernaculistas do Cristóvão (o pai?) são uma referência…

A Memória Flutuante
Porque parece ser um bom historiador da educação (mesmo que não o assuma). E por tal sabe relativizar e enquadrar, como ninguém, alguns dos actuais cenários da educação. Novel blogger, ganhou, merecidamente, um lugar de honra nas minhas visitas quase diárias. Tem uma mentalidade curricular que não me parece vulgar na geração dele. E porque é das muito poucas pessoas que mais me deve entender (concordando ou não), em termos epistemológicos, quando falo das questões do currículo.

Arte por um Canudo 2
Porque o caracteriza uma certa inocência e candura pelas imagens e pelos textos que me seduz. Porque é completamente despretensioso.

Conversamos?!
Porque é um óptimo blog para ler e perceber coisas da “trama humana” em particular e, em geral, é de uma erudição invejável. A Lucília levanta questões e deposita reflexões tão pertinentes que eu até tenho medo de comentar por poder parecer um ignorante. É, de facto, o que a sua sageza me faz sentir…

Da Escola
Porque é fundamentadamente opinativo. Porque é incisivo. Porque não parece ter medo. E, apesar de ser da escola de outros tempos, denotar uma frescura não usual.

Fábulas
Porque é querida, muito esclarecida e pertinente nas suas posições. É uma professora do 1.º C.E.B. que eu gostaria de ter tido como aluna. Seria um desafio num certo marasmo desse universo (com razoáveis excepções).

Mais do Mesmo
Porque é (também) sportinguista. E fala do que sabe e não mais do que isso. Não se aventura em grandes solilóquios. Fala de futebol e de escolas com uma coerência e simplicidade de assinalar. E porque amiúde não tem papas na língua...

O Almocreve das Petas
Porque gosta de História contemporânea de Portugal. Porque é bibliófilo (e, se calhar, bibliómano...). Porque recebe os mesmos catálogos de alfarrabistas e antiquários que eu. Porque tem um nome espectacular.

O Fio de Ariana
Porque me faz lembrar de mim há anos atrás. Porque vejo, em post’s curtos e plenos de conteúdo um trajecto académico onde sobressaem as pequenas e grandes vitórias, as pequenas e grandes amarguras.

OutrOlhar
Porque levanta questões interessantes sobre educação (em especial gestão escolar) e, amiúde, sustenta-as com excertos de autores e as próprias fonte. E, apesar de não concordar com a toda a filosofia da “sua” Escola Cultural, é pertinentíssimo nas suas posições.

Ponto Triplo
Porque é um blog com excelentes links para a “ciência pura e dura” e por vezes não tão pura e não tão dura assim…

Professorices
O que dizer do Decano? Porque é um bom “diseur” de muitos assuntos, reflecte, fundamentadamente, sobre o Ensino Superior e o que me parece ser um dos melhores especialistas sobre o Processo de Bolonha. Entusiasma-me o entusiasmo abrupto dele por assuntos e sou, igualmente, esmorecido pelo seu esmorecimento pelos mesmos. Mas, Helas!, terminou a sua produção bloguística.

Que Universidade?
Porque é uma excelente fonte de link’s sobre muitos assuntos do Ensino Superior. Em vez de ir aos motores de pesquisa procurar notícias, eu vou ao blog do MJMatos. Quando oiço pela rama qualquer coisa relevante sobre o E.S. lembro-me: “logo vou ao «Que Universidade?» saber mais…

Univercidade
Porque é assertivo também. Não tem pejo em assumir, destemidamente, as suas posições (mesmo que eu discorde de algumas delas) e porque mantém uma regularidade apreciável. Porque é dos sites sobre Ensino Superior o que mais me informa e enforma. Porque é dos poucos que compreende a (grande) necessidade de formação pedagógica certificada em professores do Ensino Superior.

E ainda há os outros que constam na lista à esquerda de que falarei oportunamente na continuidade deste post...

segunda-feira, maio 02, 2005

Mãe ontem e Mãe hoje...


Ontem comemorou-se o Dia da Mãe. O Alexandre (nosso filho) lembrou-o (com uma ajudazinha) à sua Mãe. Hoje é o Dia da Mãe dele já que ela comemora o seu aniversário. A ela que tem sido, muitas vezes quase sozinha, o pilar e sustentáculo desta família, rendo aqui as minhas mais sinceras, profundas, sentidas e merecidas homenagens.

"Bela, sem enfeites. De uma beleza que acaba de se arrancar ao sono..."
(Jean Racine)

domingo, maio 01, 2005

Wanna know what a coward is? Or… the plausible denial…

INTROITO 1: já passei por algumas escolas de ensino superior. Nelas muitos assistentes que estavam a fazer doutoramento não viam com bons olhos uma futura passagem para o quadro com base na aquisição do novo grau. A eles era comum o facto de, embora a aparência não o denotar, não serem bem vistos pelo órgão directivo. Ora por não concordarem com tudo o que ele difundia e assumirem-no, ora por reivindicarem os seus direitos, ora por estarem simplesmente a fazerem, e assumirem-no também, o seu doutoramento. Sabiam, em suma, que a posse do grau não augurava bons auspícios. O mesmo não se passava com outros docentes, na maior parte dos casos antigos na casa e, na maior parte dos casos, já professores-adjuntos de nomeação provisória ou definitiva. A estes, e só a estes, haviam as bolsas do PRODEP às quais o Conselho Científico conferia gentilmente o amén. Numa outra escola onde estive depressa me apercebi que se passava o mesmo: diferentes nomes, as mesmas pessoas, as mesmas práticas de amiguismo, caciquismo, de “scratch my back and I’ll (eventually) scratch yours”, compadrio e a corrupção fácil e barata. Numa das escolas, dois assistentes doutorados foram corridos e um terceiro saiu pelo seu pé dada a “exigência” espartana: especificidade da carga horária, natureza bizarra das disciplinas e localização das mesma nos dias de semana, sobrecarga de orientação de estágios, etc., que lhe impunham para não falar de um certo isolamento psicológico a que foi sujeito. A tudo isto não foi alheia a circunstância de um outro assistente esconder que era detentor da posse de grau de Doutor. Não tenho conhecimento se actualmente a pessoa já o divulgou…

Noutra escola, embora se chamassem a todos os mestres de “Doutor” nos documentos internos da escola, as não renovações, por coincidência, impendiam sobre os assistentes que tinham cometido o pecado, de certo modo, de publicitar que já viam o fundo do túnel no tocante ao fim do doutoramento. Exceptuando os “antigos à casa” a quem se esperava, franciscanamente, que terminassem o grau de mestre para se abrir o respectivo concurso para professor-adjunto.

INTROITO 2: nos períodos de desemprego entre uns empregos e outros, submeti, amiúde, candidaturas a concursos públicos onde explicitamente mentia por omissão a posse de habilitações literárias. Numas referia a posse de uma licenciatura incompleta noutros o 12.º ano, e noutros apenas omitia o mestrado. Fui preterido algumas vezes por, e passo a citar “excluído por excesso de habilitações” mesmo cominicando ter uma licenciatura incompleta não chegando sequer à fase da entrevista. O exemplo mais paradigmático foi o Instituto de Reinserção Social. Num primeiro concurso a nobre instituição excluiu-me pelo tal “excesso de habilitações” e muito mais tarde, “permitindo-me” ser entrevistado, comunicou-me um (então) “sub-director” que “se [eu] pensava que vinha para aqui para depois singrar como técnico superior em detrimento das pessoas que já cá temos há anos está [estou: eu] muito enganado!”. A todos os concursos que me excluíram por alegadas habilitações em demasia havia algo em comum: eram instituições públicas, ergo, do Estado. Já para concursos em escolas do Ensino Superior, não raro vejo candidatos, opositores a mim, doutorados serem preteridos por candidatos “da casa” licenciados ou mestres…

INTROITO 3: finalmente parece que o meu “eterno” doutoramento vai encarreirar. Orientador quase formalizado, projecto feito, base de dados em estado avançado e cerca de 80 páginas já escritas, provável integração em pelos menos dois projectos internacionais,… e, embora a mãe do meu filho revele alguma compreensão tomando conta do nosso filho quando eu estou embrenhado no computador a escrever para a tese, ele aparece-me, de vez em quando, ao lado da secretária com uns olhinhos de “Pai?! Brinca comigo...”, vou conseguindo escrever e adiantar alguma coisa. Mas sim. Eu tenho um filho, tenho quase quarenta anos e tenho que pensar nele, no seu futuro…

SOMATÓRIO DOS INTROITOS: Pois… por muito que advogue, nesta minha veia sindicalista, a defesa dos direitos adquiridos, a excelência da qualidade no Ensino Superior em geral e a qualidade da formação pedagógica em particular e... alguma integridade..., saberei ter, quando terminar o grau, o discernimento para fazer o mesmo que alguns dos meus amigos covardes. E lamento se desiludo os meus colegas da blogosfera. Já fui muito queimado: nas “instâncias próprias” e nos “momentos apropriados” saberei dizer: "Doutoramento? Não, não tenho. Talvez qualquer dia…"


When the going gets tough… or... do you want to throw the first stone? Or yet... are you sure you're capable of judging me?

sábado, abril 30, 2005

Um mero acento ou talvez algo mais…

Já uma vez chamei a atenção a alguns dos meus colegas da blogosfera que, nos respectivos blog’s retirassem o acento circunflexo do nome do meu. Na altura disse: “«Acontecencias» não é, pelos vários dicionários que consultei, uma palavra que faça parte do léxico português. Por tal não se sujeita às regras gramaticais, designadamente as de acentuação, da língua de Camões. E não leva acento circunflexo. Corrijam-me se estiver enganado. «Inventei-a» para, logo a seguir, descobrir que já era usada no Brasil… Helas!”. Se eu estiver errado, os linguistas, filólogos ou vernaculistas em geral que me corrijam…

Uma rápida visita aos blog’s que visito quase diariamente revela os que escrevem bem e os que escrevem “mal” o nome deste blog.

Escrevem bem:
O Fio de Ariana
OutrOlhar
Professorices
Univercidade
Fábulas
Mais do Mesmo
Que Universidade?
BlogUÉ
Professor. Professor…
Conversamos?!
Os Nossos Queridos Jornalistas Desportivos
Nós-Sela
Ponto Triplo
Profidências
Atmosfera
A Destreza das Dúvidas
6 em 1 & Algo Mais
Prozacland
Arte por um Canudo 2
Paixão da Educação
(In)Firmus
Educa Portugal – Educação em Debate

Escrevem “mal”:
Ar Fresco
A Memória Flutuante
Políticas Públicas
Do Portugal Porfundo
Crónicas do Deserto
Da Escola
Pé de Meia…
Berra-boi
Ar Fresco

E ainda há aqueles que escrevem "outras coisas":
Lobices onde consta "PauloLopes"
Um Ponto de Fuga onde consta “Antecedências” (!)

Há ainda outros blog’s que têm os links para outros blog’s em letras muito pequininas ao longo do lado esquerdo ou em fundo de página. Esses não apurei. Vá... quando tiverem um tempinho, corrijam lá se faz favor...

sexta-feira, abril 29, 2005

O problema da matemática ou a matemática do problema?

Já vou um bocado atrasado neste debate depois de ter sido tratado pela saltapocinhas e pelo Varela de Freitas, isto é, por pessoas que o conhecem melhor do que eu. Assim sendo, farei uma breve sistematização por pontos:

1. Oiço demasiado a palavra "mais" em detrimento da palavra "melhor". Mais horas abertas nas escolas do 1.º C.E.B., mais horas supostamente dedicadas ao ensino da matemática, mais horas de formação para os futuros professores do E.B., mais horas de monitorização para aqueles e outros."Mais professores" não se ouve. Continua a sanha do "como fazer mais coisas sem gastar mais dinheiro?";

2. Parece emergir a ideia que se pode fazer melhor mantendo, sem dó nem piedade, a prata da casa. Tal vai encontrar muitos obstáculos: muitas escolas do 1.ºC.E.B. já estão abertas tantas horas quanto podem (e devem), muitos professores já estão na escola em actividades lectivas tantas horas quanto podem (e devem), muitos professores de apoio (quando existem) já tem tantas actividades e despendem tantas horas quanto podem (e mais do que devem), muitas salas já estão ocupadas quanto podem (e mais não podem), muitos materiais (quando existem ou quando existem em número suficiente) já são utilizados quanto podem (e desgastam-se) e muitas crianças já estão muitas horas na escola (mais duas horas e meia para conforto de muitos paizinhos…). Não obstante, defendo o conceito de manter as escolas (que o possam) mais tempo abertas. Em muitos países as instalações escolares são aproveitadas ao máximo: desde OTL’s a muitas outras valências (incluindo nocturnas) que não para crianças assumindo-se como verdadeiros centros comunitários.

3. A ideia de ocupar furos vai encontrar dificuldades logísticas consideráveis: Embora muitos sejam previsíveis (por exemplo: o/a docente está de baixa ou pior: não há docente), muitos dos “feriados” ocorrem sem conhecimento antecipado: como planear actividades com tal imprevisibilidade? Conhecidos ou não os furos, haverá um escalonamento dos professores que se vão ocupar das actividades para aqueles? Como? Provavelmente estão, à mesma altura, com as suas turmas. E se não estiverem? Serão consideradas horas extraordinárias?

5. Subjaz-me ao diagnóstico de insucesso escolar na área da Matemática, a ideia, implícita e errada, de alguma incompetência por parte dos Professores do 1.º C.E.B. na leccionação da mesma, já que é sobre estes que, primeiramente incide um diagnóstico de necessidades de formação. Como orientador de estágios num passado próximo, tive oportunidade de me aperceber de bons e menos bons estagiários, eventualmente, bons e menos bons futuros professores. Como em tudo…

6. A medida de restringir o acesso de futuros professores do 2.º e 3.º C.E.B. é quase uma intenção vazia de concretização. A ser implementada a curto ou médio prazo, a medida só encontrará efeitos nos alunos que, entrando “agora” no ensino superior, terminam os cursos daqui a 3 ou 4 anos e comecem a leccionar. Bom, é sabido que em educação o investimento é feito a médio ou longo prazo mas a realidade portuguesa tem mostrado que cada legislatura propõe e implementa as “suas” medidas na educação extinguindo ou esmorecendo as medidas da legislatura anterior…

7. Por outro lado, restringir o acesso a alunos que não tenham tido sucesso a matemática no ensino secundário parece-me derivar de uma relação causa-efeito, que apesar de parecer lógica ao senso-comum, padece de um exclusivismo relativamente incompreensível: supõe-se que quem tenha negativa às disciplinas de Ciências no secundário já possa ser um bom professor de Ciências no Básico? E noutras disciplinas? Só porque a Matemática tem mais altos índices de insucesso? Estamos, daqui a 5 ou 10 anos a debater a oportunidade da mesma medida para as Ciências ou outras? O problema pode residir no facto de ser permitido, para os cursos de formação de professores, não obstante algum afunilamento por via das provas específicas, a possibilidade de qualquer aluno poder aceder qualquer que seja a área que frequentou no ensino secundário. Pela positiva, assumo que incidir em medidas a longo prazo e cuidar de algumas a curto prazo, pode ser proveitoso: a monitorização dos docentes em formação ou início da docência é pertinente. Não obstante, e pela positiva, julgo que é ao nível do 2.º e 3.º C.E.B. que mais deve incidir algum rigor na selecção dos futuros docentes. Mas não só aos de Matemática…

8. E o ponto mais fudamental: parece haver uma ideia de “mais matemática” e não “melhor escola”. Certo e sabido que muitos alunos têm dificuldades a Matemática porque… têm dificuldades a Português. A nível da leitura, da interpretação…. Como já referiu bem o Varela Silva, a concepção de “extra-curricular” encontra eco numa mentalidade curricular algo tacanha ao nível do 1.º C.E.B: há a “escola escolar” e, ainda intra-muros do edifício escolar, a “escola menos escolar”. E a "Lógica curricular aditiva" sobrepõe-se: mais horas para Matemática “roubando” horas a… Português? Educação Física? Expressões? Corporiza a ideia que sempre combati, expressa em alguns colegas meus e em futuros docentes, “os quinze minutinhos das Expressões (que mais não é preciso porque é mais «brincadeira») e depois a horinha da Matemática, intercalada entre os trinta minutinhos do Estudo do Meio”, que enforma os planos das aulas e as aulas propriamente ditas. Já Decroly (e muitos outros) falava dos “Centros de Interesse” que se sobrepunha a esta lógica curricular disciplinarmente compartimentada. Aqui o professor não é um gestor do currículo mas um especialistazinho que vai trocando de “farda” conforme os 15, 30, 45 ou 60 minutos da especialidadezinha que está a leccionar… no tocante ao 2.º e 3.º C.E.B. não há uma atitude de interdisciplinaridade que favorece uma noção de currículo abrangente.

9. Embora seja de louvar a intenção de começar a actuar ao nível do 1.º C.E.B., não me estranharia que se fosse um nível mais atrás e se incidisse no âmbito do ensino pré-escolar. De pequenino se torce o pepino.

10. E o pepino da Matemática anda, contrariando de certo modo o ditado, tão torcido

quinta-feira, abril 28, 2005

O fim de uma era…

O blog Professorices vai-nos deixar. O João, benignamente viciado na blogosfera, tomou a decisão recentemente. Em alternativa, direccionou os seus fieis leitores para um outro site e criou um fórum para a continuar a tertúlia ("com um gin tónico") que tanto preza. Não será a mesma coisa… é, de certo modo, o fim de uma era…

Respeito, obviamente, a sua decisão. Durante anos deliciou-nos, informou-nos e enformou-nos com as suas crónicas sobre tudo e mais alguma coisa e, especialmente, sobre o ensino superior, no qual denota uma das visões mais sustentadas, informadas e reflectidas da nossa “praça”. Este post é e não mais do que isso: uma homenagem ao João Vasconcelos Costa. Que nos continue a informar e educar por outras vias… mas que continue…

quarta-feira, abril 27, 2005

Wanted: FMI…

"Cachucho não é coisa que me traga a mim,
Mais novidade do que lagostim.
Nariz que reconhece o cheiro do pilim,
Distingue bem o Mortimor do Meirim.

A produtividade, ora aí está, quer dizer,
Há tanto nesta terra que ainda está por fazer,
Entrar por aí a dentro, analisar, e então,
Do meu 'attachi-case' sai a solução!

FMI Não há graça que não faça o FMI!
FMI O bombástico de plástico para si!
FMI Não há força que retorça o FMI!

Discreto e ordenado mas nem por isso fraco.
Eis a imagem 'on the rocks' do cancro do tabaco.
Enfio uma gravata em cada fato-macaco,
E meto o pessoal todo no mesmo saco.

A produtividade, ora aí está, quer dizer,
Não ando aqui a brincar, não há tempo a perder!
Batendo o pé na casa, espanador na mão,
É só desinfectar em superprodução!

FMI Não há truque que não lucre ao FMI!
FMI O heróico paranóico 'hara-quiri'!
FMI Panegírico, pro-lírico daqui!

Palavras, palavras, palavras e não só,
Palavras para si e palavras para dó.
A contas com o nada que swingar o sol-e-dó.
Depois a criadagem lava o pé e limpa o pó.
A produtividade, ora nem mais, célulazinhas cinzentas,
Sempre atentas,
E levas pela tromba se não te pões a pau,
Num encontrão imediato do 3º grau!

FMI Não há lenha que detenha o FMI!
FMI Não há ronha que envergonhe o FMI!
FMI
..."

Quem for da minha geração, ou anterior, e reconhecer estes versos, diga-me onde encontro um suporte magnético ou digital com os mesmos. Ando à procura há anos…

terça-feira, abril 26, 2005

Envolvido duplamente numa chainletter

Há muitos anos atrás, era eu um rapazito inconsequente que ficava preocupado com aqueles envelopes anónimos que traziam uma moedinha de vinte e cinco tostões e uma fotocópia de uma reza. Acompanhava-a uma instrução explícita de que teria que reencaminhar a carta para mais 25 pessoas (mais as respectivas 25 moedinhas de 25 tostões) senão impenderiam sobre o “destinatário” da carta graves consequências. Porque Diabos teria eu aberto o envelope?

Mais tarde quiseram envolver-me num esquema em rede que alegadamente faria ao envolvido ganhar muito dinheiro. Enviava-se um cupão para três endereços (um duma empresa e dois à escolha do seleccionado) acompanhados de 3 notas de quinhentos escudos e entrava-se numa fila. Se essa corrente não se quebrasse, o dinheiro seria multiplicado e receber-se-ia, por troca, várias notas de quinhentos escudos. Agora surgem estas correntes por e-mail ou via blogs.

O desafio de responder a algumas perguntas chega-me por via de dois blogs: A Memória Flutuante e o Prozacland.

Seguindo uma boa sugestão duma colega da blogosfera, coloquei as respostas na caixa de comentários.

segunda-feira, abril 25, 2005

“Mãe? Agora os soldados são nossos amigos? Dantes não eram porquê?”

É a pergunta inocente de uma criança de 8 anos no dia 25 de Abril de 1974 ao deparar-se com uma certa comoção nas ruas e uma emissão televisiva fora do comum. Nos dias seguintes os cartazes do MFA com um soldado e um popular a representar o povo só fizeram cimentar a ideia de soldados inimigos do povo, que batiam no povo. De facto, enquanto criança no pré-25 de Abril nunca me tinha apercebido disso, de que os soldados eram inimigos do povo.

Agora”, o contraste desta súbita amizade fez emerger a pergunta. “Não. Os inimigos eram outros. Não tinham farda e fizeram mal ao teu avô… mas dantes não se podia dizer isto em voz alta”. Sim, o espectro do meu avô ter sido maltratado por uma polícia política ainda hoje enforma e informa a minha relação com a ditadura do Estado Novo e o período da primavera marcelista.

Ainda hoje lamento não ser mais velho no dia 25 de Abril de 1974. Para perceber o que se passava, para participar no que se passava, para ser parte do que se passava…

sábado, abril 23, 2005

Plagiaram-me... sim, desta vez foi a mim...

A senhora é professora de História. Vice-coordenadora da Secção Pedagógica de um Centro de Investigação dedicado à investigação/em memória de Humberto Delgado. E manteve, até há poucos meses, um blog designado HistóriaeCiência.weblog.com.pt. E não teve pejo em copiar 53 imagens que eu digitalizei do meu próprio acervo bibliográfico e coloquei num site meu, para ilustrar posts do seu blog. Está tudo aqui. Contactada por e-mail há já algum tempo, nada respondeu. Basta colocar o cursor nas imagens e clicar "propriedades"

Porventura a investigação/homenagem a alguém com valores anti-fascistas, de liberdade e respeito pelos outros e a vice-coordenação da "Secção Pedagógica" do referido Centro (financiado pela FCT) não lhe ensinaram a importância da apropriação indevida de imagens. O blog, por sua vez, trata, entre outros, da "História da Cultura e das Mentalidades". Não creio que vá perorar sobre a propriedade intelectual ou a apropriação indevida...

Homo sum. Humani nihil a me alienum puto…

sexta-feira, abril 22, 2005

“Fac-simile? Não, não temos nada desse autor” ou o atendimento em certas livrarias…

Já noutra altura tive ocasião de falar sobre o atendimento em algumas das nossas livrarias. Contei uma anedota (“Flagrantes da Vida Real, II”) onde, face à minha pergunta: “Tem edições fac-similadas”, “Como?”, pergunta o livreiro (?), “Fac-similes”, respondo eu. E lá vai o homem ao compudador regressando pouco depois e dizendo: “Não, não temos nada desse autor...”.

A verdade é que eu gosto de cirandar pelas prateleiras das livrarias. Revoltear livros cujos títulos me chamam, muito ou pouco, a atenção, sentir a fragrância da tinta, do papel, do livro novo, perscrutar os índices, folhear as bibliografias, revirar as badanas e ler as contra-capas. Para mim, ir a uma livraria é quase como ir ver uma exposição. Os livros dizem-me: “Estou aqui para ser folheado. Folheie-me!”. Tal como um quadro poderia dizer: “Admire-me, contemple-me!” ou uma escultura bradar: “Apalpe-me! Escorra, levemente os seus dedos pela minha superfície… sinta-me” (se for o caso disso...). É quase uma relação erótica ou um orgasmo… hum… - lá vou eu ser pretensioso – intelectual, quando o livro contém um título, uma ideia, uma imagem que encontra eco nos meus quadros de referência ou choca com os mesmos.

A coisa tem sido mais difícil desde que a paternidade me abençoou mas lá estou eu de vez em quando. Da última vez, numa livraria em Cascais, enquanto o Alexandre entretinha-se a folhear livros com “popós”, aventurei-me, receoso, a inquirir a senhora que atendia.
-“Se faz favor? Procuro um livro que se chama […]. O autor é um senhor chamado Brazelton… quer que soletre?
- “Não, não é preciso…”, responde a senhora.
E lá escreve ela uma versão do nome do autor:”Breseltom”. Eu consigo vislumbra-lo:
- “Não, não é assim que se escreve…”, interrompo.
- “Ah, não? Temos cá um autor com este nome… o livro é sobre quê, mesmo?
- “Qualquer coisa o «Grande livro das Crianças ou da Criança»… não sei bem…
- “Ah! Está na secção de «Pedagogia» lá em baixo”.
Vou lá. Procuro. Não encontro tal secção. Procuro melhor… regresso à senhora…
- “Desculpe… não encontrei essa secção…
- “Mas está lá… entre «Gestão» e «Informática»!
- “Importa-se de vir comigo lá?”, pergunto, quase atormentado… ela vem comigo.
- “Vê? Está aqui: «Psicologia/Sociologia»!”, ufana…
- “Tinha dito «Pedagogia»…”, comento, humilde.
- “É tudo a mesma coisa! É tudo a mesma coisa! Encontrou o livro?
(…)

Por favor… coloquem gente com um palmo de testa nas livrarias! Dêem emprego às centenas de licenciados em História desempregados ou doutras Ciências Sociais e Humanas a atender nas livrarias e não qualquer burgesso ou burgessa à frente de um balcão de atendimento de uma livraria. Para bem da cultura. Para bem de todos nós. Incluindo os burgessos…

"The problem of dumb ass is that they are too stupid to know it"...

quarta-feira, abril 20, 2005

Com Ratzinger não há insecto voador que escape! Ratzinger... da Bayer…

Não sei bem qual é a percepção dos comentadores “oficiais” (neste caso daqueles que se dedicam a questões religiosas… José Pacheco Pereira será, certamente, um deles dado que é especialista ou generalista em todas as ciências…) mas a mim encontrou uma grande decepção a escolha deste papa. A ortodoxia venceu e por mais que o adjectivem de “papa de transição”, vislumbro que o homem vai durar, durar…

Não deixa de ser curioso que os discursos altamente elogiosos ao falecido João Paulo II se façam acompanhar da ideia de Ratzinger ser um dos seus “apóstolos” de ideologia ou mesmo “braço direito”. Se Karol Woyjtila era assim tão "bom" e se este Ratzinger partilhava a sua ideologia quando ao papel da igreja no actual enquadramento geo-estratégico mundial, das duas uma: ou João Paulo II não era assim tão “bom” ou este Bento XVI não é assim tão ortodoxo…

Vem isto a propósito de uma historieta acerca do novo papa. Anedota? Não me parece.

Teria Joseph Ratzinger convocado uma sessão ecuménica onde se teriam deslocado os máximos representantes de diferentes religiões: maometanos, hinduístas, budistas, protestantes, até os ortodoxos russos e muitos, muitos outros. Cada um falou, no púlpito, dos principais grandes ideias da sua confissão. A cada um a plateia disse: “Muito bem, Muito bem! Se se sentem à vontade com esses princípios, se os praticam em consciência e se têm essa vontade de ajudar os outros [todas tinham, de certo modo] está muito bem”. Até que chegou a vez de ir ao púlpito a Igreja Católica Apostólica Romana. E Joseph Ratzinger foi o escolhido. Disse, ufanando: “Só há uma verdade! É a nossa! Tudo isso é muito bonito mas são disparates! Não se admitem desvios à verdade!”.

Eis que se aproxima um senhor, chamado Padre Telemond (cf. “As Sandálias do Pescador”: excelente filme que já vi várias vezes) que diz em surdina:
- “Com Ratzinger não há insecto voador que escape! Só os rastejantes [isto é, os que se acomodam e aceitam a ortodoxia dogmática católica] Ratzinger... da Bayer…

ADENDA: descansem os "apóstolos" da chain letter que muito brevemente responderei à mesma. Fui duplamente solicitado...

ADENDA2: muitas acusações podem impender sobre o passado do Papa Bento XVI. Todavia, uma delas não lhe pode ser assacada. Vejo, irreflectidamente, alguns críticos a destacarem a sua pertença à "Juventude Hitleriana" enquanto criança/jovem. A eles digo: Tenham juízo! Considerem a natureza da época histórica. onde as crianças eram desde cedo fortemente ideologizadas [possuo cartilhas de leitura nazistas que o atestam] e obrigadas a ingressar nessa organização sem direito a contestação. E mesmo que o tivessem não teriam maturidade para tal. A estes críticos (eventualmente alguns perfilaram a organização da "Mocidade Portuguesa" e confessam-no saudosisticamente), a inclusão involuntária de uma criança numa organização cuja dimensão não estava ao alcance da sua compreensão parece ser um pecado de lesa-pátria... Tenham juízo!

terça-feira, abril 19, 2005

Profetismos e dislates em educação: o inicio da viragem? (Ciclo da Pedagogia III)

Em Portugal parece-me ser emergente uma tendência para, finalmente, desacreditar os profetas da desgraça em educação ou aqueles que, portadores de um discurso mais ou menos coerente, dotados de alguma oratória e com lugar cativo em artigos de opinião de órgãos de comunicação social, vão proferindo, sucessivamente verdadeiros disparates sobre o mundo da educação em Portugal. Uns e outros falam de cor: são credenciados investigadores, calcorreiam, ou calcorrearam durante muitos anos, alguns obscuros corredores de prestigiadas Universidades, e, enclausurados nos luxuosos e livrescos gabinetes de suas casas ou dos seus gabinetes de investigação, referem-se, generalizando, a micro-realidades que nunca ou mal pisaram, pouco ou parcamente conhecem. Criticam o Ensino Básico desconhecendo a realidade das suas escolas, as dificuldades dos seus professores, etc., peroram sobre o Ensino Secundário satelizando-se em memórias nostálgicas de outros tempos (os Liceus) e arvoram-se em defensores de um ideal de ensino superior que, manifestamente, não cumprem, antecipando cenários depressivos e vilipendiando, vaga e não identificadamente, professores universitários "facilitistas". Coisas que estes profetas da desgraça e dislatistas da educação, obviamente, não afirmam ser.

A esta veia crítica não fundamentada e apressada não é alheio um desconhecimento das coisas. Não despicienda é a incapacidade, não confessada, de encarar a educação como um campo que pode ser teorizado, compreendido e explicado por uma ou várias ciências, quer se lhe chame Pedagogia ou “Ciências da Educação”. Não só neles mas – arrisco a dizer – boa parte da população, a educação sempre foi encarada como um mundo onde o que vale é o bom senso, a informação dada pela experiência, o “ver como se faz”, a experimentação pela tentativa e erro e a desvalorização, não confessada, de investigação e sistematização. A estes energúmenos, a educação não parece ter, digamos, as condições e os requisitos epistemológicos para se constituir numa ciência com objecto e método próprios. Quando os teorizadores, muitas vezes professores, com credenciais de investigação insuspeitas e um conhecimento do terreno incontestável, produzem conhecimento sobre Pedagogia ou “Ciências da Educação” estarão, na mente dos profetas da desgraça e distatistas da educação, a “falar do que não há”, de algo como se não fosse susceptível de produzir conhecimento e, enfim, a verborrear sobre algo não científico. E lá vêem os profetas e dislatistas a culpar os pedagogos e “cientistas da educação”. Como em todas as esferas, há os bons e os maus. E eu não sou totalmente capaz de os identificar…

Na história das “Ciências da Educação” podemos considerar – simplisticamente, confesso – como que três grandes fases: uma primeira caracterizada pela pedagogia e psicologia experimentais onde o que se produzia, ainda muito informado por crenças do “Antigo Regime” acreditava naquilo que fosse apenas testável em contextos de laboratório (no sentido restrito do mesmo) e caracterizada por um cunho muito funcionalista; uma segunda, já muito informada pelas teorias da sociologia onde se coloca o destaque mais nas desigualdades (cf: Bourdieu, Passeron, Althusser e seguintes) e na hierarquização social (com uma fase mais tardia que professa discursos do tipo “pedagogias radicais” informadas por Giroux e outros) e; finalmente uma terceira, aquela que estamos emergentemente a começar. O que diz esta? Sobretudo espalhou-se em várias direcções: desde uma neurofisiologia da educação que nos informa, com um rigor científico assinalável que determinadas aprendizagens não se devem necessariamente (e neste sentido cumpre lacunas deixadas pela sociologia) à condição sócio-económica dos pais dos meninos ou clivagem entre o conjunto de referências culturais da escola e dos seus clientes mas, por exemplo, à falta de uma proteína específica no cérebro, passando pela psiquiatria da educação, que nos fala de certos traumas e o seu efeito em contextos de ensino-aprendizagem, até à economia da educação (e/ou administração escolar) que sugere interessantes medidas profissionais de gestão das escolas e, claro, uma das minhas preferidas, a antropologia da educação, que analisa nos revela como há discrepâncias entre o que a escola ensina e o que se aprende e como muitas vezes não nos apercebemos que podem ser a mesma coisa mas com rótulos discursivos diferentes. E muitas, muitas outras com contribuições tão inovadoras que nem passam pela cabeça dos profetas e dislatistas da educação. E é a esta última corrente que se pode dever uma inicial e apreciável desacreditação dos profetas da desgraça e dislatistas de/sobre educação.

No meio disto tudo temos a História da Educação. Para quem perde um bocadinho de tempo com esta, depressa se apercebe que os discursos fatalistas de e sobre educação e o empolamento de supostos cenários de crise extrema nas escolas em particular e nos processos de ensino-aprendizagem em geral, são seculares em Portugal: já no século XIII se falava nisto e os centos de anos seguintes evidenciam profetas, cenários e realidades ainda mais trágicos/as que os/as actuais. Esta visão os profetas da desgraça educativa e dislatistas da educação não conhecem, não querem conhecer ou convenientemente omitem. Conhecer o passado para explicar o presente e prever o futuro? Pois... tá bem...

Vem isto a propósito da situação mais disparatada para justificar um cenário de extrema crise educativa que me lembrei recentemente e que ocorreu há poucos anos. Não, não me refiro a Maria Filomena Mónica ou conjugalidades. Estou a falar de José Pacheco Pereira.

Convidado para um programa enfadonho de debate sobre a (crise da) educação na RTP1 onde estavam professores, alunos e outros comentadores, o autor do abrupto quis provar, in loco, in situ e in directu, a ignorância de alguns alunos recentemente saídos do 12.º ano e em espera de entrar para o ensino superior. E que fez ele? Fez duas perguntas “simples” (disse ele) a alguns dos miúdos onde, de acordo com o opinion-maker, a não respsosta provaria, irrefutavelmente, a ignorância dos moçoilos. Não sendo na altura moçoilo, não fui capaz de responder às perguntas porque, simplesmente, não as compreendi. As perguntas foram tão mal formuladas que julgo que a maior parte dos espectadores do debate não souberam responder e, digo eu, os leitores deste blog também não conseguirão. Evidenciou-se, a meu ver, o extremo desconhecimento de pedagogia, educação ou “Ciências da Educação” (ou o que quer que seja) que Pacheco Pereira patenteia, não obstante não o afirmar e até se ter pavoneado quando, muito naturalmente, não obteve resposta às suas perguntas.

Quer experimentar? A pergunta era:
- “se fizermos um furo muito fundo no Pólo Norte o que encontramos? E se fizermos o mesmo furo no Pólo Sul, o que encontramos?

Sabe a resposta? Até pode saber mas certamente que a pergunta lhe oferece, no mínimo, dúvidas.

A resposta estará brevemente nos comentários deste post…

quinta-feira, abril 14, 2005

“A covardia dos intelectuais”: quem é covarde?

De certo modo impulsionado por DK, escrevi, quase de um só jorro, alguns comentários ao artigo de Maria Filomena Mónica (MFM) publicado no suplemento "Mil Folhas" do "Público" de 9 de Abril, "A Covardia dos Intelectuais". Cá vai:

1. Em primeiro lugar, MFM parece defender um relativismo cultural (RC) só fora das Universidades (quererá englobar os Politécnicos? Não se sabe...). Assim, se o RC, condene-se ou não, resulta de uma atitude que decorre da (co)existência de diferentes culturas, das trocas que operam entre si e da evolução que ocorre numas e noutras, só se deverá considerar os intercâmbios e os resultados deles que forem relevantes para o saber universitário. E quem decide o(s) critério(s) dessa relevância? Para já MFM... não... porventura estarei a ser injusto. Porque tais intercâmbios também ocorrem ao “mais alto nível cultural”. E esse MFM não quer escamotear. Ela decidirá, então, quem preenche esse requisito ou não. Furedi parece faze-lo: logo deve ser seleccionado.

2. Em segundo lugar, MFM, ao admitir o relativismo cultural fora das Universidades mas não, ou não tanto, dentro elas, assume, mais ou menos explicitamente que os discursos (e as práticas) de ligação Universidade/sociedade podem estar desajustados. Por conseguinte, as instituições universitárias não devem formar profissionais para a sociedade civil e, neste sentido, aquelas instituições não devem conhecer a sociedade (com ou sem rap e com ou sem telenovelas) para a qual os seus diplomados se devem direccionar. Deverão, sim, insistir em “Homero, Mozart ou Eça” e, após formados, incuti-los à força nos jovens imigrantes e pobres em geral (em processo de escolarização ou não) que, explorados pelas elites económicas e sociais (e intelectuais?) se esforçam por sobreviver. Passam fome? Dêem-lhes “Homero, Mozart ou Eça” que o alimento da alma alimentará, seguramente o estômago. A Universidade deve impor, autocraticamente um certo etncentrismo cultural à sociedade que a rodeia, para MFM. E nem pensar no oposto. Porque os verdadeiros iluminados são aqueles que calcorreiam os gabinetes e corredores obscuros (mas únicos detentores do "mails alto nível cultural") da instituição universitária.

E, MFM, tem andado pela “sociedade”? Pelos hipermercados, por exemplo? Da última vez que lá fui vi, a par de revistas de telenovelas e CD's de rap, alguns livros de Homero, muitos CD's de Mozart (alguns até a preço acessível como brinde de revistas que trazem resumos de telenovelas) e livros de Eça.

E o que andarão a fazer os sociólogos (da sua área, remember?) e outros investigadores da área das Ciências Sociais e Humanas que, justamente nas Universidades, estudam e investigam os fenómenos sociais das telenovelas e da música rap? Perderão, a seu ver, tempo a estudar estas “infra-culturas”? Seguramente já que não há aqui “Homero, Mozart ou Eça”. Será que podemos ressuscita-los?

3. MFM padece daquilo que designei na última “Revista do Ensino Superior” do “saber geracional válido”. Saudosista e enfermada por uma boa dose de nostalgia da “escola do meu tempo”, apelida dos saberes que adquiriu na sua geração como “válidos e fundamentais” considerando os ulteriores (de gerações seguintes à sua) de inúteis ou desadequados. MFM parece advogar que a Universidade se submeteu a um papel de transmitir saberes não úteis, valendo-se de Furedi e – atabalhoada e convenientemente, de Lyotard para se fazer valer das suas posições. Lyotard é, precisamente, um dos autores que defende a integração de novos saberes nas estruturas de produção, sistematização e veiculação dos mesmos: as universidades. Mas MFM só leu o excerto que lhe foi mais conveniente.
O “saber puro” (o que é?), o “deleite de descobrir algo de novo” (com “Homero, Mozart ou Eça”?), “o prazer da experimentação, de ter cabimento nos estabelecimentos de ensino deixou de ter cabimento dos estabelecimentos de ensino”, verbera MFM. O principio do prazer deve sobrepor-se à utilidade e pertinência do conhecimento? Os “choques tecnológicos” (sic) ou a tecnologia em geral são despiciendos? Mesmo que criem empregos ou lhe permitam usar o seu visa ou aceder à(s) sua(s) (generosas?) contas bancárias por via do seu pc no conforto do seu lar? Ou MFM tem as obras completas de padrão em cima da sua secretária do pc? E as “competências linguísticas” que agora minimiza? Não era MFM que se queixava de que os estudantes chegavam às Universidades com claras dificuldades de interpretação e dando erros ortográficos e sintácticos de palmatória? Se bem me lembro colocava o labéu desta responsabilidade nas malfadadas “Ciências da Educação”... para MFM não se deviam mudar os tempos mas as suas vontades parecem faze-lo...

4. Muito certa está MFM na tendência de “infantilizar” alunos, em parte efeito da massificação do acesso de alunos no ensino superior (agora já fala de ensino superior e não de “Universidade”. Será que...?). Convenientemente (?) esquecendo estudos (sociológicos, diga-se de passagem: andará MFM só a reler “Homero, Mozart ou Eça” e distraiu-se?) ulteriores ao que cita, omite que se os alunos são “infantilizados” são-no por alguém, de que se os ”«saberes» trazidos [pelos alunos] para as salas de aula são hostis à difusão do conhecimento” é porque alguém o permite. A este insulto, mais ou menos explicito a todos os estudantes, ocorre a tendência recorrente em MFM: dos males da Universidade ou do Ensino Superior, sobre os respectivos professores, pobres alimárias esforçadas e subservientes do “saber privilegiado” de “Homero, Mozart ou Eça”, não podem e não devem impender quaisquer responsabilidades. Então a quem devemos situa-las? Às “Ciências da Educação”? Aos grandes decisores e às suas grandes instâncias? MFM costuma localizar, amiúde o locus da “culpa”. Desta vez não ou não tanto...

5. Felizmente, cita MFM de Furedi, o afrouxamento da concepção elitista da Universidade (e as práticas consentâneas) parece “corresponder a uma ideia surgida no interior da própria elite”. Mas não da elite que compõe a classe docente universitária, pensará MFM. Ó MFM? Não lhe ocorreu que, tendo-se apercebido a elite que a Universidade ao ser massificado e lhe ser difícil ou impossível continuar a cumprir um papel social afunilador, prefere a elite desvalorizar a função elitista da Universidade de modo a prosseguir uma “political agenda” da própria elite? Isto é, se eles não podem continuar a criar “mais de nós”, que se nivelem por baixo para continuarmos a sermos “só nós”?

A este nível é altamente conveniente que os ciganos continuem a aprender, informalmente, o "atirar facas", os angolanos a "tocar tambores" e os camponêses a "arte da desfolhada" já que esta etnicização das especificidades culturais conduz a uma hierarquização de culturas (e das relações sociais) onde o "mais alto nível cultural" (corporizado em MFM por "Homero, Mozart ou Eça") assegurará a defesa do "verdadeiro saber". E aqui MFM vai dando o seu generoso contributo por via de uma estratégia de vitimização pelos males do relativismo (ou será ralativismo?) cultural e oprimida defensora da verdadeira cultura: aquela que adquiriu em Oxford.

6. E diz MFM: “As actuais políticas educativas constituem um cruzamento entre o infantilismo e a psicoterapia: menorizam os estudantes, porque os nivelam pelo menor denominador comum, e psicoterapizam a cultura, porque não querem beliscar a "auto-estima" dos adolescentes. O resultado é a ignorância dos jovens licenciados, muitos deles tendo frequentado, com enormes custos para as famílias, a universidade. Basta ver o concurso da RTP1 Um Contra Todos para nos apercebermos até que ponto a falta de cultura geral aflige os participantes.
Ó MFM? Eu pasmo quando desvaloriza as “telenovelas” e as “canções rap” e agora se serve de um produto tele(lixo)visivo para servir como parâmetro avaliador da “falta de cultura geral”! Credo! Este excerto é seu ou redigiu o artigo em co-autoria com mais alguém? Se é o próprio Furedi (que tanto cita) que “pressupõe serem as audiências elevadas incompatíveis com a excelência“. Em que ficamos? Se “as massas populares [telespectadores televisivos] são intrinsecamente estúpidas” (suas palavras citando Furedi) como pode um concurso televisivo ser bom para avaliar a “cultura geral”? Não estou a reconhece-la...

7. E de novo regressamos às teses conspiracionistas da “ortodoxia pedagógica” nos males da Educação, desta vez por parte dos “poderosos, para que os meninos pobres não compitam, no mercado de trabalho, com a geração nascida em berço de oiro”. Desconfio que está a dizer, parcial novidade, que desta vez, os maléficos teóricos das “Ciências da Educação” são afinal, vítimas de uma “hidden political agenda” dos poderosos, isto é, testas de ferro incônscios do facto de que estarão a servir propósitos elitistas de hierarquização social. Bom, estamos (sim, eu sou das “Ciências da Educação”) a “melhorar”: passamos de ideologizadores malvados a manipuladas marionetas de propósitos obscurantistas.

8. Dou-lhe alguma razão no “eudeusamento” da internet (embora escamoteie grandes vantagens na divulgação do conhecimento: são as próprias instituições de ensino superior que criaram a internet e cada vez mais a usam em esquemas de investigação e produção de conhecimento em rede que julgo não ser contra...) mas ao afirmar “a profusão recente dos blogues poder dar a ilusão de que existe uma maior democratização da opinião pública. Nada é menos verdade: a maioria dos blogues são versões modernizadas do que dantes se escrevia nas paredes das casas de banho públicas” aconselho-a a não criar um blog com permissão de comentários ou a faze-lo anonimamente.

9. Conclui MFM com mais uma boa dose de nostalgia saudosista e romântica da “cultura do meu tempo”. Apenas não refere o que eu gostaria de saber: inclui-se MFM na élite que, coitada, parece perder o seu poder intelectual de impor “Homero, Mozart ou Eça” ou, além de se entreter a ver o concurso televisivo “Um Contra Todos” e a teclar no teclado dos livros de Platão que encimam a sua secretária, prossegue a “hidden political agenda” que referi?

Caracteriza-a ou não a "covardia dos intelectuais" de que fala?

segunda-feira, abril 11, 2005

Aniversário de um príncipe





















O meu rapaz fez hoje dois anos. Eles crescem tão depressa...
Ei-lo a pensar: "hoje... sei lá... sinto-me pedante... tá ver?"

domingo, abril 10, 2005

Evidente… mente!

António Nóvoa continua a surpreender pela vastidão e qualidade da sua produção bibliográfica. No último livro, muito recentemente publicado, “E vid ente mente. Histórias da Educação” (Asa, 2005). Assegura que “o que é evidente, mente. Evidentemente”. Em algumas passagens defende, com muito mais mestria do que eu, aquilo que, em parte, já evoquei no último artigo publicado na revista do Ensino Superior (link ainda não disponível) num artigo intitulado “Eles Agora Não Sabem Nada! O Currículo Oficial e Oficializado e o Saber Geracional Válido: Divergências Naturais ou Regressão do Sistema?”. Vejamos alguns dos excelentes trechos do vice-reitor da U.L.:

Da futilidade e as falsas certezas sobre educação:

As coisas da educação discutem-se, quase sempre, a partir das mesmas dicotomias, das mesmas oposições, dos mesmos argumentos. Anos e anos a fio. Banalidades. Palavras gastas. Irritantemente óbvias, mas sempre repetidas como se fossem novidade. Uns anunciam o paraíso, outros o caos – a educação das novas gerações é sempre pior que a nossa. Será? Muitas convicções e opiniões. Pouco estudo e quase nenhuma investigação. A certeza de conhecer, de possuir a «solução» é o caminho mais curto para a ignorância. E não se pode acabar com isto?

e

Quando se trata de educação, nenhum político tem dúvidas, nenhum comentador se engana, nenhum português hesita. Palavras gastas. Inúteis. Banalidades. Mentiras. O que é evidente, mente. Evidentemente

E, numa síntese oportuníssima, o transbordamento conferido à escola nos últimos 200 anos:

Começou pela instrução, mas foi juntando a educação, a formação, o desenvolvimento pessoal e moral, a educação para a cidadania e os valores…
Começou pelo cérebro, mas prolongou a sua acção ao corpo, à alma, aos sentimentos, às emoções, aos comportamentos…
Começou pelas disciplinas, mas foi abrangendo a educação para a saúde e para a sexualidade, para a prevenção da tabagismo e da toxicodependência, para a defesa do ambiente e do património, para a prevenção rodoviária…
Começou por um «currículo mínimo» mas foi integrando todos os conteúdos possíveis e imagináveis, e todas as competências, tecnologias e outras, pondo no «saco curricular» cada vez mais coisas e nada dele retirando.


E, de facto, “a escola não pode tudo”. Mutatis mutandis...

sexta-feira, abril 08, 2005

Flagrantes da vida real (IV)

Há anos atrás uma colega uma colega de licenciatura, algo ensimesmada, muito competitiva e não cultivadora das relações sociais, andava, de há uns tempos para trás, a aproximar-se de mim. Já ouvia comentários do tipo que só eu tinha conseguido penetrar na carapaça dura da rapariga. Não me incomodava. Não tinha interesse afectivo na rapariga e nem ela o tinha por mim, penso eu. Parecia ser verdade o facto de haver uma crescente confiança em mim da parte dela.

Aquilo que me pareceu uma evidência disso foi um dia quando me pediu para ir com ela a uma loja de roupas e “dar uma opinião o mais sincera ou brutal possível” das vestimentas que ia experimentar. Sentia-me algo desconfortável com a recente função, bem como com o convite para entrar no gabinete de provas (já que não tinha cabides para pendurar a roupa que se tirava para substituir com aquela que se experimentava e eu poderia segurar nas mesmas). Acedi ao primeiro mas não ao segundo pedido.

Esperei por breves momentos decidido, na minha pouquíssima capacidade de avaliar a estética da roupa feminina, que a minha colega trocasse de roupa. Abre-se a cortina e ela, de saia e blusa, pergunta: “Então?” Hesitei mas resoluto na confiança que havia depositado em mim, espetei-lhe uma resposta decidida:
- “A blusa fica-te muito bem mas a saia nem pensar! Faz-te gorda!”
E ela responde:
- “A saia? A saia é a que eu já trazia…”

Ops!

quinta-feira, abril 07, 2005

Escrever, meu Deus, escrever...

A pressão de escrever algo por imposição só é comparável à fluidez de escrever espontaneamente...

ADENDA: os meus parabéns ao Hugo pelo términus da tese.

segunda-feira, abril 04, 2005

Os execráveis 15 minutos de tolerância académica: "naturalmente"…

A pontualidade não é um valor muito apreciado a nível das práticas no nosso lebenswelt, ainda que o seja no tocante ao discurso. Tanto no mundo académico, como no mundo político e social, pulula a ideia de que qualquer reunião, aula, dia de trabalho ou simplesmente encontro marcado, chegar atrasado, naturalmente, até 15 minutos não é chegar atrasado. É fazer valer-se de um “mecanismo” natural mais do que tacitamente aceite: os professores atrasam-se, naturalmente, até 15 minutos no início da aula, os alunos, cientes desse facto, não chegam senão, naturalmente, antes dessa hora. Em encontros, congressos e afins, por muito ou pouco que se atrase a comunicação ou conferência anterior, a seguinte pode, naturalmente, atrasar-se até 15 minutos porque isso também é natural. E a convicção cimenta-se: os nossos jovens são, por muitos de nós, educados nesse execrável e natural atraso.

Por tudo isto, os horários formalmente marcados não são senão isso: uma formalidade já que podem, naturalmente, começar até 15 minutos depois mas não tão facilmente terminar 15 minutos depois. E se o fizeram, farão com que a ocorrência seguinte possa, naturalmente, começar com um natural atraso até 15 minutos. E ocorre o efeito em catadupa: todas as restantes ocorrências estarão, concatenadamente, atrasadas, naturalmente, até 15 minutos. É como se todos os relógios andassem atrasados até 15 minutos. O professor pode estar perfeitamente disponível para iniciar a aula na hora estipulada mas, naturalmente, "esperará" (!!!) que se esgotem os 15 minutos de tolerância enquanto sorve lentamente a bica no bar após o que poderá correr para a sala porque só a partir dessa altura estará "atrasado".

Abomino esta execrável "tolerância". É um mau exemplo que damos uns aos outros e eternizamos. Por duas vezes, não há muito tempo, marquei dois encontros com duas pessoas que se interessaram pelo meu espólio de material escolar antigo para efeitos de propósitos de investigação. Ambas chegaram atrasadas. A ambas disse “às tantas em ponto” num aviso que não me pareceu ser, na própria altura, ser levado muito a sério. A primeira pessoa não apareceu, naturalmente, até 12 minutos depois, pelo que fui embora e nunca mais a vi. A segunda (abalei ao fim de 9 minutos de atraso) disse-me, tempos depois do encontro não concretizado, que só tinha se atrasado 7 minutos. Garanti, educadamente, que não. Pela hora de chegada apurada entre nós, constatamos que a senhora tinha chegado 22 minutos depois da hora marcada. Apenas os 7 últimos eram considerados, de facto, "atraso" para a senhora: "Não me diga que contou os primeiros 15 minutos?!", exclamou, naturalmente, a mesma. De facto, não há pachorra…

Ad perpetuam rei memoriam…

sexta-feira, março 25, 2005

Ensino Superior e Representações…

Parágrafo introdutório de uma entrevista a um novel ministro refere que ele é originário da

circunspecta obscuridade da vida universitária.

O excerto, dito de uma forma inofensiva (?), traduz, de facto, a imagem que perpassa das universidades e/ou do ensino superior em geral no vulgo…

Fieri fecit

sábado, março 19, 2005

Flirts ou hiperflirts…

Não gosto muito de ir a centros comerciais e a hipermercados. Mas a moderna vida de hoje obriga-me. E lá vou eu de vez em quando. Antes de nascer o meu filho adquiri o hábito de ir aos hipermercados em horas onde não abundavam pessoas. Era mais rápido o pagamento nas caixas e a circulação no interior da grande superfície. E lá apareciam as senhoras…

As senhoras de Cascais, as mais das vezes entre 35 e 40 anos, bem penteadas e vestidas que circulavam desacompanhadas no hipermercado “Jumbo” de Cascais costumavam abordar-me em “encontros casuais” que me divertiam assaz. Julgava, na altura, que a variedade de compras que fazia (compras típicas de solteiro?) me conferiam o estatuto de “solteiro abordável”. Mas divertia-me com esta espécie de assédio (sexual?) mais ou menos camuflado. Perseguido por breves minutos, seguia-se a abordagem: "Leva aí muitos doces… é um homem doce?", dizia uma senhora que circulava o carro desacompanhada. "Ah… um homem energético [bebidas isotónicas no carrinho] É desportista?", sussurra-me uma trintona sozinha. "Veio de carro? O meu está na oficina. Se me levar as compras, janta comigo em casa. Que me diz?". E mais outros exemplos.

O que levava estas senhoras a isto? Solidão? O sexo? Não sei. Nunca acompanhei nenhuma pese embora a insistência daquela a quem levei as compras a casa para "subir". Senhora divorciada de Oeiras, conhecida de ex-aluna da profissionalização convidou-me para uma discoteca na 24 de Julho em Lisboa. Mal a conhecia. Perguntei ingenuamente: "Quem mais vai?" a que responde a trintona: "É preciso ir mais alguém?". Pois…

Não as censuro. Não sei se faria o mesmo. Na altura sabia-me bem. Fazia-me bem ao ego. Hoje…
- «Ó Armanda? É preciso alguma coisa do “Jumbo” que aproveito e vou lá agora que deve estar pouquíssima gente??»

quinta-feira, março 17, 2005

José Mourinho... (I)

Tirei esta anedota daqui.
Arsene Wenger, Alex Ferguson e José Mourinho morreram num acidente de avião e foram encontrar-se com o Criador. A suprema divindade virou-se para Wenger e perguntou ao treinador o que era realmente importante para ele. Wenger respondeu que era o planeta Terra e que proteger o meio ambiente do planeta era o mais importante de tudo. Deus olhou para Wenger e disse: "Gosto da tua forma de pensar. Anda cá sentar-te ao meu lado esquerdo".

Deus então fez a mesma pergunta a Ferguson. Este disse que as pessoas e as suas opções pessoais era as coisas que mais valorizava. Deus respondeu: "Também gosto da tua forma de pensar. Anda. Senta-te ao meu lado direito".

Deus virou-se finalmente para José Mourinho. Este encarava a divindade com alguma indignação. Deus perguntou: "Qual é o teu problema, Mourinho??". Mourinho respondeu: "Acho que estás sentado na minha cadeira. Vá! Desanda daí!"
(traduzido e adaptado)

ADENDA: Agradeço o prémio oferecido pelo Atmosfera a este blog como sendo o blog mais pedagógico e bem educado. ;-]

sexta-feira, março 11, 2005

Flagrantes da Vida Real (III)

Naquele dia estava mais atarefado do que o costume na preparação de umas jornadas que a minha escola de então organizava de dois em dois anos. Fazia parte da Comissão Científica e, na prática, fazia tudo nela e muitas das funções de outras pessoas.
Não recebia os boletins de inscrição, a cargo de dois funcionários administrativos, mas eram-me encaminhadas por telefone e por mail todas as dúvidas que interessados manifestavam, sobretudo os que tinham comunicações para apresentar. E havia “dúvidas” do arco da velha: uns queriam que se mudasse a data das jornadas, marcadas há meses, porque a data não lhes era conveniente, outros perguntavam se podiam ter mais tempo de exposição dada a “complexidade” da sua comunicação e outros ainda questionavam a temática onde a sua comunicação havia sido inserida.

Uma das pessoas que era adepta desta última reclamação queria, à força, ser inserida noutra temática já que o dia em que lhe tinha calhado a sua comunicação não era da sua conveniência. Por mais que lhe explicasse que tal não era possível dado que implicaria alterações tipo “bola de neve” em vários comunicantes, ela insistia. Sendo óbvio que estas jornadas, como muitos encontros científicos afins, desejava comunicações originais, ergo, nunca proferidas antes, a senhora queixosa, com toda a naturalidade do mundo, saiu-se com esta:
- “Sabe… eu faço a comunicação em cinco minutos. Já fiz a mesma comunicação tantas vezes mas com títulos diferentes em vários congressos, que já está tudo bem ensaiadinho…”

Homo sum. Humani nihil a me alienum puto…

quinta-feira, março 10, 2005

Constantineeee...

Vi o filme. Para quem era fã do Matrix não desilude muito. Para quem gosta de ficção e mistérios religiosos ainda menos. A estória (adaptação do comicHellBlazer”) gira à volta de um jogo de poder entre o céu e o inferno, anjos e demónios, Deus e o diabo. O filme, numa atmosfera de “O Corvo” ou a “Gotham” de Batman, é profunda e estupidamente católico: reproduz fielmente o imaginário bíblico católico apostólico romano: recompensa do céu para quem tem bons actos e castigo do inferno para quem não tem. Todavia, como noutros filmes afins, as personagens bíblicos são de moralidade duvidosa. Se tal não espanta para Lúcifer e os seus acólitos, já o faz para o anjo Gabriel (representado por uma senhora: os anjos não têm sexo, não é?).

Alterna entre o efeito especial elaborado (o inferno, algumas cenas de violência e as “paragens no tempo”) e a simplicidade de receitas esotéricas na passagem pelo inferno: ter os pés debaixo de água ou o corpo todo para não se queimar quando se entrar nas terras de Satanás. Constantine é um anti-herói. Espécie de exorcizador discreto e muito senhor de si, luta e orienta a sua vida, afinal, por um lugar no céu. Quase o consegue enganando Lúcifer. Não o porfiando, atinge aquilo do qual já se tinha resignado: a total limpeza de uns pulmões cancerosos pelo fumo do tabaco que lhe davam meros meses de vida pelo três maços de tabaco diários. E esta é uma mensagem moral mais ou menos explícita no filme: os malefícios do tabaco, mesmo para quem conhece os cantos da casa do céu e do inferno, sobretudo do segundo. Goste-se ou não de “Constantine”, julgo não se consegue ficar indiferente…

terça-feira, março 08, 2005

Salário igual para trabalho igual? Não brinquem…

O meu colega Jorge Morais (um dos dois únicos bloggers que conheço pessoalmente) gosta de levantar, por vezes, o porta-estandarte do lema "para trabalho igual, salário igual" situando-o no quadro do ensino superior politécnico e universitário.


Sempre me questionei se a lei enunciava explicitamente esse princípio. Fui ver. Diz “ela”:

Trabalho igual [é] aquele em que as funções desempenhadas ao mesmo empregador são iguais ou objectivamente semelhantes em natureza, qualidade e quantidade

“Considera-se trabalho de valor igual aquele que corresponde a um conjunto de funções, prestadas ao mesmo empregador, consideradas equivalentes, nomeadamente, às qualificações ou experiência exigida, às responsabilidades atribuídas, ao esforço físico e psíquico e às condições em que o trabalho efectuado”
[artigo 32.º, n.º2, respectivamente alíneas c) e d) da Lei n.º 35/2004]

Sabendo que o Código do Trabalho não se aplica ainda à administração pública mas que, simultaneamente, muito provavelmente é anti-democrático e inconstitucional um trabalhador da administração pública não estar sujeito aos mesmo princípios democráticos que um do sector privado, como é que ficaria a aplicação daquela lei nas universidades e, especialmente no ensino politécnico? Andará a nossa justiça invertida?

Vejamos: não é nada raro um assistente (do 1.º ou 2.º triénio) do ensino superior politécnico ter as mesmas funções, as mesmas qualificações ou experiência e, obviamente, as mesmas responsabilidades, esforço físico e psíquico, condições onde o trabalho é efectuado e o mesmo empregador que um professor-adjunto ou um professor-coordenador? Isto quando não tiver mais habilitações, experiência, responsabilidades e piores esforços físicos e psíquicos e condições onde o trabalho é efectuado. O mesmo se aplica, em menor grau julgo eu mas sem dados para me sustentar, entre um assistente e um professor auxiliar ou um professor auxiliar e um associado ou ainda entre este último e um catedrático no mundo universitário.

Muito me agradaria que houvesse uma avalanche de pedidos de aplicação daquele princípio nas instâncias próprias.

Ad augusta per angusta…

quinta-feira, março 03, 2005

Alguns vícios “pedagógicos” dos professores do Ensino Superior. Habilite-se e ganhe prémios! (Ciclo da Pedagogia II)

Contrariamente a um post anterior (“Charlatanices da Pedagogia no Ensino Superior e não só... [Ciclo da Pedagogia I]”), este não é um sistema de categorias da nossa classe docente do Ensino Superior mas um glossário de exemplos de comportamentos “pedagógicos” que constatei, mais uma vez, do meu contacto com outros docentes quer como aluno, quer como docente.

Os “anti-pedagogos

São aqueles docentes que consideram a Pedagogia uma “ciência menor”, uma “não ciência” ou, no máximo, uma ciência restrita a uma faixa etária menor que termina com a adolescência. Normalmente nada sabem sobre a ciência pedagógica, pouco sabem de educação a não ser o que resulta da observação imediata. Tem concepções também algo imediatistas sobre o processo de ensino-aprendizagem. Na maior parte dos casos são docentes já bem estabelecidos na carreira que acham que já nada têm a provar embora, dentro destes, seja cada vez maior o número de docentes que acham que é politicamente correcto ter um discurso pró-pedagogia mas não uma actuação consentânea.

Se é este tipo de docente, envie um SMS para "ANTIPED [espaço] 4766" e habilite-se aos três volumes do excelente livro "Os Charlatães da Pedagogia"!

Os “pseudo-pedagogos

São aqueles que julgam que sabem tudo ou o que é suficiente saber sobre pedagogia para a situação de ensino-aprendizagem na sala de aula. Baseiam o seu conhecimento “num livro” que leram “uma vez” e que “até tinha algum interesse” mas que não conseguiram “ler até ao fim”. Tão pouco sabem que até se dão ao luxo de dizer barbaridades sobre a “pedagogia”. Opinam que, no máximo, a “pedagogia” sintetiza-se no trinómio “professor-matéria-aluno” com destaque para o primeiro pelo exercíco da autoridade e da disciplina. Até ensaiam, por vezes, algumas “estratégias pedagógicas” que se limitam a responder à pergunta “o que posso fazer para parecer um bom professor e ser gostado enquanto tal?” ou “Como dar a entender aos meus colegas recém-docentes que sou um bom professor, pedagogicamente activo e preocupado?




Se é este tipo de docente, envie um SMS para "PSEUDOPED [espaço] 4767" e habilite-se a uma colecção completa do "Dicionário Pedagógico das Escolas Madraças Iraquianas"!

Os “aproveitadores da pedagogia

São aqueles que alegam ser muito interessados na pedagogia mas usam-na para proveito próprio. Geralmente fazem-no para tirar proveitos relativamente a projectos de investigação em andamento. Alegam que a investigação é muito importante, que um bom professor deriva, necessariamente, de um professor "cientificamente bem actualizado" e, de preferência com projectos de investigação em andamento. À guisa dos princípios do “reforço pedagógico” e de “envolver os alunos”, usam a “pedagogia” para fazer dos discentes (e colegas docentes…) mão-de-obra barata (recompensando-os com valores ou décimas destes) para efectuar a recolha de dados de investigação que resultará em publicações encimadas com o seu nome e financiamento para novos projectos. São, também, na maior parte dos casos professores já bem estabelecidos na carreira.



Se é este tipo de docente, envie um SMS para "APROVEPED [espaço] 4768" e habilite-se ao guia “Os três tipos de Poder de Fritzel: Poder de Mandar, Poder de Fazer Obedecer e Poder de Tirar Proveito de”!

Os “Ditadores biblio-pedagógicos

São aqueles docentes que acham que a “pedagogia” consiste inteiramente numa boa organização e apresentação dos conteúdos e numa clareza e precisão na transmissão dos mesmos. Tendem a apresentar os conteúdos por tópicos muito arrumadinhos que desenvolvem um a um, em acetatos (que privilegiam) imaculadamente limpos e organizados (sim: eles têm cuidados e não apresentam transparências cheias de informação. Desses cuidados sabem) e tendem a expor os conteúdos nas aulas, lendo-os ou não mas com um discurso falado igual ao escrito: sintacticamente bem estruturado e com as pausa devidas. Falam alto, alguns muito alto, sem ter consciência disso e amiúde espreitam os cadernos de apontamentos dos alunos para ver se estes reflectem a aula. Se sim, “foi uma boa aula”. Cercam-se de manuais, (que frequentemente seguem como uma “bíblia”), colectâneas de textos, sebentas e outros documentos escritos. Têm um (ou vários) dossier(s) de apoio à cadeira bem organizados com separadores coloridos, sínteses e fotocópias dos acetatos.

Se é este tipo de docente, envie um SMS para "DIBIBPED [espaço] 4769" e habilite-se a um altifalante alimentado por plutónio da mais recente geração electrónica!

Os “sacerdotes pedagógicos

São aqueles a quem alguém disse e acreditaram que “não existe crueldade infantil”. Leram Jean-Jacques Rousseau e acreditaram piamente. São ultra-adeptos do “movimento da escola nova” e acham que o exercício da função docente é uma “missão” ao qual se deve proporcionar todos os sacrifícios. Tendem a infantilizar os alunos, a sobrestimar as suas capacidades, a desculpar todos os comportamentos atribuindo a natureza dos comportamentos menos correctos a “um ambiente familiar desadequado” ou a “traumas infantis”. Passam imensas horas em casa a imaginar estratégias pedagógicas diferentes que experimentam sucessivamente umas após as outras, produzem imensos materiais para uso na sala de aula e… frequentam sessões de psico-terapia…

Se é este tipo de docente, envie um SMS para "SACERPED [espaço] 4770" e habilite-se a cem vales de horas no Hospital Magalhães de Lemos!

segunda-feira, fevereiro 28, 2005

Um "profissional do ramo"...

Num comentário a um post dum blog, um professor, referindo-se à sua profissão, diz:

"Sendo [eu] um profissional do ramo (...)"

Mas... mas... mas... porque é que isto não me soa bem? Porque é que isto faz-me lembrar mais um agente de seguros ou um vendedor de colchões? (sem ofensa aos citados..)

...Hummm.. sic luceat lux!

domingo, fevereiro 27, 2005

Léxico Alexandrino

Mais um post dum pai babado.
Eis algumas das palavras que o meu filho Alexandre, a caminho dos dois anos, usa e compreende o significado:
- "atá?": geralmente dito de uma forma interrogativa, quer dizer “onde está?”;
- "bêbê" ou "bibi"; significa bebé ou qualquer criança nova;
- "cocó": significa “cócó” ou “quero fazer cocó” ou “já fiz cocó”;
- "cáca": designação atribuída a coisas sujas, a lixo, a papeis velhos, partes de brinquedos partidas e outras afins;
- "mamã": significa obviamente mãe;
- "": a segunda palavra mais frequentemente usada é a forma de exprimir a negativa;
- "nauuu!" onomatopeia imitativa do mio do gato;
- "qué": significa "quero", desejo", ou ainda "aproximem isso [um objecto] de mim"
- "papá": significa “pai”, isto é, eu ;-];
- "paúo": é uma deturpação de “Paulo”, isto é, eu ;-);
- "paí": significa “pai”, isto é, eu ;-D;
- "pópó": a palavra mais frequentemente usada, quer dizer carro, automóvel, calhambeque ou qualquer outro veículo que visivelmente tenha quatro rodas;
- "papa": significa comida;
- "titi": significa “chichi” ou “quero fazer «chichi»” ou “já fiz «chichi»”;
- "": diminutivo de “bitó” que, por sua vez é diminutivo de “Victor Hugo” que é o nome do nosso gato.

E há ainda frases resultantes destas palavras e outras palavras...