O 13.º Trabalho de Hércules: publicar no "Público"
A imagem ao lado esquerdo evidencia o destino dos artigos enviados para o diário "Público" por quem não tem "nome" na praça pública, por quem não tem faz parte do círculo de amizades pessoais da redacção editorial ou Conselho de Administração do mesmo jornal ou qualquer outra afinidade com qualquer deles. Vem isto a propósito das minhas tentativas de publicar o que quer que seja no "Público" (exceptuando anúncios comerciais) quer destinados a "artigos de opinião" quer a "cartas ao director".
Quer experimentar? Envie um escrito qualquer para o campo próprio aqui e apure se os destinatários se dão ao trabalho de lhe responder. Isto apesar da “extensa equipa redactorial” do referido diário citando as palavras que o seu provedor me dirigiu por e-mail. Nas trocas de correspondência que mantive para com o provedor do “Público” (esse, de facto, responde) queixei-me, sobretudo mas não só, da total mutez e completa falta de feed-back que o jornal manifesta para com os seus leitores. Isto apesar da tal “extensa equipa” que, pela arquitectura da página do link acima, parecer dar a entender uma filosofia e intenção de comunicação aberta. Mas não. Fechado, muito fechado é o adjectivo que melhor caracteriza o crivo por onde têm inexoravelmente que passar não só os autores de artigos de opinião a publicar como também a simples predisposição para responder a um e-mail.
O “Público” parece ter uma restrita “lista sagrada” de escrevinhadores articulistas autorizados a publicar artigos nas suas páginas. E só as cúpulas estarão informalmente autorizadas a fazer entrar novos nomes. Ora, ocorre, não especificando ninguém em particular, que o critério de acesso a esse rol escamoteia a qualidade daquilo que escrevem os seus listados. O nome que encima o artigo parece ser mais relevante do que o conteúdo que se lhe sucede. Não se deixem enganar pela imagem de bonomia do seu Director nas frequentes aparições na televisão. Ter a “honra” (?) de publicar um artigo de opinião naquele jornal bem poderia ser o próximo trabalho do mitológico Hércules
Mas claro é que esta posição pode, evidentemente, ser enquadrada na minha subjectividade pessoal, senão num sentimento de raiva e ciúme por nunca ter publicado nada naquele elitista diário. Até descobrir que esta minha subjectividade é partilhada por vários bloguistas naquilo que me parece ser a mera ponta de um iceberg. Vejamos alguns excertos apenas com as iniciais dos seus autores:
- “É, de facto, muito curioso que as pessoas que se pronunciam - e geralmente mal... - no Público sobre Educação sejam quase sempre as mesmas e, sobretudo, venham todas do mesmo lugar. Será coincidência?... DK”
- “Não sei porquê, sou "persona non grata" para o Público. Só por teimosia é que ainda continuo a mandar-lhes artigos. Muito raramente publicados. E nunca quando põem em causa notícias do jornal ou escritos dos comentadores amigos. Isenção e pluralidade! JVC”
- “Deve ser por essas e por outras que o director do Público é alvo de um abaixo-assinado no blog Barnabé JM”
- “Já pensaste enviar os textos [para o “Público”] assinados por outra pessoa? LAC”
- “Nada lá [no “Público”] passa contra os opinadores de estimação do director. JVC”
Bom… e se isto não é sintomático permitam-me que lhes conte um episódio que não deixa de o ser. Estava eu no meu quarto ano da licenciatura, em 1991 ou 1992, quando surge um artigo de opinião do “Público” que assacava os males do sistema escolar ao “eduquês” e à pretensa e maléfica produção científica pedagógica das “Ciências da Educação” as responsáveis pela situação “caótica” das escolas no seu todo (a coisa ainda não parou, pelo que se vê e lê…). A peça jornalística terminava com a possibilidade de um cenário catastrófico se tais “eduquêses” ou “cientistas da educação” chegassem ao poder. Orgulhoso como era, pela idade e pela situação de finalista, achei que a infâmia merecia uma resposta. Escrevi-a quase sem levantar a pena do papel. Alguns dos meus colegas, igualmente indignados, fizeram o mesmo.
Por esse dia havia um almoço de curso onde confraternizavam alunos e professores. Fui. Durante o repasto, a conversa não pode deixar de falar da polémica. Surge, da parte dum colega meu, a informação de que alguns de nós tinham escrito um texto de resposta. Corroborei e disse que também eu tinha feito um. Aquele colega e eu tínhamos feito textos separados e dado a ler um ao outro. Achamos, bem ou mal, que poderiam ser “publicáveis”. Mas, quase em uníssono, lamentamos a ínfima possibilidade de tal acontecer. Eis que intervém um nosso professor, natural das terras de sua majestade mas naturalizado português. E assevera, altivo, no seu sotaque britânico: “Para eu publicar um artigo no «Público» basta eu querer…”. E pede, a mim e ao meu colega, os textos que produzimos. Malleureusement eu tinha deixado a disquette do meu texto em casa, a cerca de 28 quilómetros de distância. O meu colega trazia-a consigo. Professor e aluno combinaram que o primeiro fazia uma leitura do artigo do segundo e que o docente, com a concordância do discente, assumia a co-autoria do texto a publicar, depois de eventuais refinadelas do mesmo. Nesse mesmo dia o britânico professor enviaria o texto para o “Público” mas precedido de um… telefonema…
Admirei-me com o que parecia ser a altivez do professor. E não jogava nada com o que eu conhecia dele. Não mais pensei muito nisso até porque na edição do dia seguinte do jornal de Belmiro de Azevedo nada constava sobre a polémica do “eduquês”, das “Ciências da Educação” ou dos cenários de crise associados. Todavia no dia seguinte, dois dias depois do almoço, portanto, lá estava chapado o artigo. Com o nome do professor e o de aluno. “Não há coincidências”, diz escritora da nossa praça. Ad perpetuam rei memoriam…
ADENDA: se os bloguistas referenciados com iniciais neste post entenderem como abuso a minha referência às mesmas, apaga-las-ei. Desejo agradecer aoNelson, ao André Pacheco por terem colocado o link deste blog nos seus bem como à gentileza do"Prof". Retribuirei o favor brevemente assim que tiver um bocado de tempo.
ADENDA 2: a edição de hoje do "Público" deixa, na secção "Cartas ao Director", adivinhar um dos critérios de selecção de cartas enviadas. Diz assim: "Sou leitor fiel desse jornal, que considero ser do melhor que se faz neste momento em Portugal.(...)" Et voilá!
6 Comments:
Neste aspecto o Público não é, infelizmente, muito diferente de uma parte significativa das instituições em Portugal. Não são a cunha, o nepotismo e os "amiguismos" de toda a espécie, as práticas mais correntes nos relacionamentos sociais e institucionais entre nós? E não constituem estas práticas os sintomas mais deprimentes do nosso défice democrático e terceiro-mundismo?
Mas não deixa de ser irónico - e altamente sintomático - que muitos desses "opinadores de estimação" assumam hoje o estatuto de autênticos profetas (da desgraça) e denunciem, lá do alto da montanha, a nossa decadência, parolismo e corrupção moral. Como diz a canção, às tantas eles fazem mais parte do problema do que da solução - ou são uma das causas da doença, e não a cura.... ;)
DK
A história é mesmo incrível. Mas só os ingénuos como eu se deixam indignar.
Bom Natal.
PJ
De facto, Daniela, tem razão. Não sei porque destaco o "Público" num país onde ele não reflecte mais do que tudo o resto. Ainda que, eventualmente, dele se deva esperar mais independência e isenção (será?)... vou com o PJ. Só os ingénuos como nós é que se ainda indignam.
Todavia, não é mau sinal tomarmos conhecimento destas coisas com uma indiferença apassivante? Não suporá uma atitude consentânea? O "direito à indignação" é uma bandeira inconsequente? Uma fachada para preservar uma falsa dignidade?
Olha... lá estou eu a ser ingénuo outra vez! Malditos genes!
Continuo em contagem decrescente para imigrar para a Suécia...
Um Bom Natal aos dois.
FELIZ NATAL!!
Um Feliz Natal para si também, Paulo, na companhia dos que lhe são mais queridos. :)
DK
Bom natal para ti primalhaçu!
Tina Santos
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