sexta-feira, dezembro 17, 2004

A Epistemologia da pôrra ou a pôrra da epistemologia?

Aqui há tempos vi-me envolvido num mini-debate que versava, de raspão, a classificação das Ciências. No seguimento, por correio eletrónico, ex-colega de escola diz-me que as "Ciências da Educação" estão "dentro" das "Ciências Sociais". Contra-argumento que aceito que as primeiras estejam "dentro" sim mas das "Ciências Sociais e Humanas". Responde o ex-colega (formado em Sociologia e docente na área) que o termo "Humanas" é redundante em relação ao "Sociais", que bastaria este último. Respondo, sem ter cogitado muito, com exemplos de algumas "ciências" que têm mais de "humano" do que de "social", que o "social" remete, necessariamente, para o gregarismo do ser humano e de que há aspectos neste que não conduzem, forçosamente, para aquele. Responde-me vagamente que o ser humano não é senão gregário... sinto, enfim, que estamos numa discussão estéril e sem saída...

Uma das saídas deste imbróglio já esteve na famosa classificação do emérito Sedas Nunes, entretanto desactualizada. Mais recentemente, para evitar divisões artificiais, tendeu-se a criar grandes categorias de "ciências": ele é as "Ciências da Educação", as "Ciências da Saúde", as "Ciências Farmacêuticas", as "Ciências Psicológicas", as "Ciências Históricas", as "Ciências do Direito", etc., etc.. Julgo que havia a intenção de provocar uma trans ou interdisciplinariedade mas a tendência do os cientistas de se colocarem nos seus "cúbiculos científicos" depressa fez ruír a intenção. Provocatoriamente pergunto, satelitizando-me à minha "área": a "Psicologia da Educação" é das "Ciências da Educação" ou das "Ciências da Psicologia"? A "História da Educação" é das "Ciências da Educação" ou das "Ciências da História"? E a "Sociologia da Educação"? Estamos, de novo, perante categorias ou constructos sociais aplicados às "ciências", agora mais abrangentes.

Mais recentemente, constatei que existe um outro sistema de categorias, institucionalizado (ou institucionalixado) pela Fundação da Ciência e Tecnologia. Os projectos financiados, os investigadores adstritos aos mesmos bem como os bolseiros já podem descansar: alguém já os colocou numa gaveta que pode não ser extactamente a mesma onde eles se situavam.

Agradam-me a perspectivas de Immanuel Wallerstein (sociólogo norte-americano) de eliminação destas fronteiras entre as "ciências" ou o magnifico artigo de Boaventura Sousa Santos feito nas e sobre favelas do Rio de Janeiro onde, explicitamente, pretente "fundir" a "ciência científica" com a prosa, com a literatura. Aconselho-o vivamente sua leitura. Há quem fale, também, em "inter-ciências" (não me lembro se com ou sem hífen).

Quanto a mim, defeituoso categorizador por excelência, se me perguntarem de que "ciência" sou, passarei a dizer "daquela, pá! Daquela que é gira, porreira!" - "Mas qual?" - "Ó pá, aquela que está ali... ao lado daquela... olha... daquela que está naquele livro no parágrafo 3.º do ponto 4 do artigo 2.º da alínea b. É essa, ora essa!"

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Paulo,
Posso pedir-lhe a referência da(s) obra(s) de I. Wallerstein que aborda(m) essa questão das ciências? Tenho pena de conhecer mal os escritos de Wallerstein - apenas li um ou outro texto sobre as célebres teorias do "modern world-system" e gostei imenso. Fico curiosa quanto ao resto...
DK

dezembro 17, 2004 9:58 da manhã  
Blogger Chris Kimsey said...

D. Kato
Como eu gostaria de o fazer! Ocorre que vi essa ideia não pelo punho do próprio Wallerstein mas em alguém que o citava. E quando deixei uma das escolas onde leccionei, a confusão de caixotes e papelada arrumados às três pancadas não deixou espaço para grandes organizações. Também o referencio, sobretudo pelas teorias dos "modernos sistemas mundiais" (d'apres F. Braudel). Julgo que consigo encontrar, sim, o artigo do Boaventura. Peço desculpa. Prometo que vou tentar descobri-lo via motores de pesquisa. Lamento desapontá-la. ;-[

dezembro 17, 2004 11:04 da manhã  

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