domingo, dezembro 21, 2003

Os actuais alunos não sabem nada? O "saber geracional válido"

A geração mais velha, mais velha do que eu, acha que os alunos de hoje não sabem nada. Têm razão? Analisemos. Há, para cada geração, um saber considerado socialmente válido. Não tenho dúvida sobre isto. Este saber pode ser consideravelmente diferente de geração para geração. Assim, a minha geração pode, por vezes, ficar admirada com o "escandaloso" grau de ignorância que a geração ulterior à minha, ergo, os actuais estudantes (e aqui refiro-me aos estudantes do ensino superior) manifestam em relação a temas tais como a história e a geografia. A geração anterior à minha e em grande parte a minha, aprendeu aquelas duas disciplinas ou áreas curriculares à custa de um ensino tradicional onde a discussão estava arredada e a memorização excessivamente presente. Provavelmente saberei mais história e geografia que um estudante de uma universidade actual, até.

Mas dizia eu, há um saber considerado válido para cada geração. Ainda há pouco o meu ex-instrutor de condução, recitando alguns versos dos seu velho livro de leitura da quarta classe, se insurgia contra o facto de nenhum aluno actualmente os saber. Foi secundado por outros velhotes presentes. Conotando-me como um especialista em educação, perguntaram a minha opinião. Olhei para eles: esperavam a minha "douta" resposta. Espetei-lhes num linguajar que considerei adequado ao vocabulário deles, esta minha teoria do saber geracional válido. Esperavam, constatei-o, que lhes desse toda a razão do mundo. Perdi o meu estatuto de especialista em educação quando a resposta não lhes agradou. Helas!

A verdade é que cada geração considera como válido e fundamental o saber que adquiriu, apelidando os saberes escolares ulteriores de inúteis ou desadequados. O meu progenitor gabava-se, amiúde, de saber de cor todas os rios, afluentes e linhas de caminhos de ferro de Portugal. Ignorando os meus avisos de que a maior parte das linhas de comboio que, acriticamente decorou, estavam desactivadas, não sabia interpretar o horário dos comboios na estação de caminho de ferro: nunca lhe haviam ensinado. Qual dos dois seria o saber mais pertinente, mais "válido"? O meu ex-instrutor de condução, face às minhas considerações sobre o uso da informática e comunicações a distância por pessoas mais idosas, perorava sobre a inutilidade de alguém da sua geração saber tal coisa. Não dizia mas pensava como algumas das minhas alunas dos cursos de complementos de formação e a auxiliar de acção educativa da minha escola: "burro velho não aprende". E, de facto, parece que alguns não...